domingo, 17 de fevereiro de 2008

PROCESSO PENAL:
É o procedimento que ocorre desde a prática do facto ilícito à possível condenação. O processo penal começa com a aquisição da notícia do crime por parte do Ministério Público (MP), que é a entidade responsável pela investigação. O MP adquire a notícia do crime por:
1. denúncia
2. queixa
3. reconhecimento próprio: directa
indirecta

FINALIDADES DO PROCESSO PENAL:
Quando se pergunta qual das finalidades será a que mais peso tem dentro do processo penal, chegamos à conclusão que nenhuma vale mais do que a outra. Assim, temos:

1ª finalidade: realização da justiça e a descoberta da verdade material.
O que será a realização de justiça? No cerne da questão, esta será procurar saber o que está por detrás da imposição de uma pena. Facilmente chegamos à conclusão que por detrás da imposição de uma pena está uma finalidade de prevenção geral de integração; ou seja, uma exigência de verdade e justiça na aplicação da sanção. A pena deve ser adequada ao crime praticado pelo agente.
O que é a verdade material? A descoberta desta é uma finalidade do processo penal. Não obstante isto, esta não pode ser uma verdade obtida a todo o custo. Esta tem de resultar de um processo penal válido e admissível, respeitando integralmente os direitos fundamentais das pessoas envolvidas no processo.

2ª finalidade: protecção dos direitos fundamentais das pessoas.
Tal protecção resulta das regras do Estado de Direito Democrático. Proteger os direitos fundamentais das pessoas significa que o processo penal deve decorrer segundo as regras do Estado de Direito. Os direitos fundamentais das pessoas devem ser respeitados em todos os momentos da vida dos cidadãos, sem qualquer excepção.
E são precisamente as regras do Estado de Direito, ligadas aos direitos fundamentais dos cidadãos que vão impedir, em muitas circunstâncias, a obtenção da verdade material, designadamente, através da proibição da valoração de provas obtida mediante tortura, coacção ou ofensa à integridade física ou moral das pessoas, nos termos do artigo 126º CPP. A obtenção de prova através destes meios vai contender com os direitos, liberdades e garantias do cidadão, nomeadamente com o conceito de dignidade humana.

3ª finalidade: restabelecimento da paz jurídica.
Este restabelecimento da paz jurídica é reunir um conjunto de garantias que os intervenientes no processo podem gozar.

4ª finalidade: concordância prática.
Qual das finalidades do processo penal devemos privilegiar? Todas as finalidades têm o mesmo peso, medida e importância. Nenhuma deve ser beneficiada, se isso puser em causa as outras finalidades; isto é, não se deve beneficiar uma em detrimento das demais. Temos, então, uma concordância prática em todas.


Devemos ter em atenção que, o processo penal é produto de uma longa evolução dirigida à escolha dos meios tendente à realização da justiça penal; devendo estar sempre na sua base os pontos estruturais da constitucionalidade do Estado. As soluções em concreto das questões basilares do Direito Processual Penal depende, na sua essência, não só da evolução como do desenvolvimento cultural e social de uma comunidade, da sua consciência jurídica e das ideologias políticas e forma de estar do Estado. Daí que, vulgarmente se designe o processo penal como o Direito Constitucional aplicado na medida em que é uma manifestação do espírito político-constitucional de um determinado ordenamento jurídico.
O Prof. Dr. Faria de Costa dirige uma crítica a esta posição defendida pela maioria da doutrina. Ainda, não existia o Direito Constitucional, já existia o processo penal, que surgiu com a 1ª proibição – proibição de incesto.

ESTRUTURAS DO PROCESSO PENAL:
Estrutura Inquisitória:
Historicamente deriva das disposições relativas aos crimes de blasfémia, heresia, adultério pensando-se que poderá ter a sua origem no processo penal do baixo-império Romano, onde os quaesitores – funcionários do Estado, encarregados da investigação do crime extraordinário, dirigido à aplicação da tortura, em que a inquisição pertencia ao tortor, manifestando-se isto nas chamadas ordalias.
Esta 1ª fase vai terminar com a regulamentação do processo e dos tribunais do Santo Ofício da Inquisição em 1229, editado após o concílio de Latrão. Esta estrutura processual só se consolidou no Direito dos Estados durante o séc. XVII e XVIII, quando politicamente se ligou às ideias defendidas pelos Estados absolutistas. O processo penal era dominado pelos interesses do Estado que não concede às pessoas qualquer interesse em termos de consideração autónoma. O julgador gozava de uma inteira discricionalidade no que respeitava à aplicação da lei, mas sempre tendo em vista o poder oficial. O arguido, aqui, é encarado não como um sujeito coactuante no processo, mas como uma mera coisa, objecto de inquisição. Assim sendo, eram ignorados os seus mais básicos direitos fundamentais em nome da protecção dos interesses do poder. Havia uma manifesta supremacia do poder estadual perante os destinatários dos seus comandos, sendo que o juiz não era mais que um burocrata da justiça, sem independência perante o poder político, competindo-lhe em simultâneo inquirir, acusar e julgar.
Neste tipo de processo, embora se pretendesse atingir a verdade material, acabava-se por atingir uma mera verdade formal. O arguido perde todo o direito à defesa; é perfeitamente lícito o recurso à tortura como forma de extrair ao arguido a confissão, tida então como a rainha das provas, de tal modo importante que, quando não fosse obtida havia lugar a uma mera “absolutio ab instantial” – decisão formal, permitindo-se a reabertura do processo com base em melhor prova, não havendo, assim, trânsito em julgado.
Esta estrutura é possível de uma grande critica, prendendo-se a mesma com o facto de privilegiar uma das finalidades do processo em detrimento das demais.

Estrutura Acusatória:
Esta é seguida nos Estados Liberais Democráticos. Aqui, a relação entre o Estado e o indivíduo ocorre em termos diferentes do anterior; levando este facto a uma reestruturação do processo penal.
Neste modelo; ao invés do anterior, onde o indivíduo surgia despido de quaisquer direitos; aqui, surge como portador autónomo de direitos naturais, inatos e inalienáveis. O processo penal surge como conformador entre os interesses do Estado, visando punir a prática do crime, ou seja, perseguir criminalmente aqueles que pratiquem determinadas condutas de danosidade social consideradas crime para que lhes seja aplicada a respectiva sanção; e por outro lado, o indivíduo que pretende afastar de si todas as medidas preventivas e restritivas da liberdade.
Entende-se, segundo esta estrutura, que não se pode entregar o indivíduo ao poder estadual, sem que ao menos lhe seja atribuída a qualidade de sujeito coactuante no processo; e como tal, sujeito de direito, portador de direitos próprios, nomeadamente o direito à defesa.
O processo penal acaba por ser uma forma de controlar o abuso do poder estadual e garantir que os direitos conferidos ao cidadão sejam respeitados. Neste modelo pretende-se tutelar os interesses das pessoas, especialmente do arguido, possibilitando-lhe de forma cabal o exercício da sua defesa. Vale, aqui, o princípio da acusação, isto é, há uma distinção entre a entidade que investiga e acusa, e a entidade que vai proceder ao julgamento, pois só assim é possível que a decisão do juiz seja imparcial, na medida em que este só poderá decidir objectivamente se não tiver conhecimento prévio da causa. Este modelo em muito se assemelha ao processo civil, na medida em que na sua forma pura, este modelo pressupõe que o processo seja visto como um processo de partes.
Ao juiz é atribuído um papel meramente passivo e formal; às partes cabe a responsabilidade probatória dividindo o ónus da prova. A verdade alcançada num processo deste tipo é meramente formal na medida em que o juiz se limita a decidir em função das contribuições da acusação e da defesa. Também, este modelo é criticado pelo facto de privilegiar a tutela dos interesses do cidadão, nomeadamente do arguido em detrimento das demais funções do processo penal.

Estrutura Mista, Inquisitória, Mitigada ou Moderna:
Este tipo de estrutura é típica dos Estados autoritários, muito embora numa função moderna, ou seja, não é nos mesmos termos do Estado absolutista do séc. XVII e XVIII.
Caracteriza-se pelo facto de haver uma separação entre a entidade que acusa e a que julga. A acusação competia ao MP e o julgamento ao juiz. Todavia, neste modelo a entidade que acusa fá-lo em face de uma investigação chamada instrução preparatória que é realizada pelo julgador, que depois de terminada ordena ao MP que acuse.
É uma estrutura processual penal que dá importância à descoberta da verdade material e realização de justiça. Neste tipo de modelo, o MP e o defensor são vistos como órgãos da administração estadual.

Estrutura Acusatória Integrada por um Princípio de Investigação:
A estrutura que hoje perfilhamos é a estrutura acusatória integrada por um princípio de investigação (Estado de Direito Democrático).
Em 1º lugar, a semelhança da acusatória no seu modelo puro, onde o arguido surge como portador de direitos fundamentais como direito à defesa – artigo 61º CPP. Por outro lado, existe o princípio da acusação, pois a entidade que investiga e acusa é diferente da que procede ao julgamento.
Entre nós, é o MP que investiga assim que adquire a notícia do crime, que pode ser por:
· conhecimento próprio: (órgãos de polícia criminal) – directo ou indirecto
· denúncia facultativa ou obrigatória
· queixa (crimes semi-públicos e particulares – artigo 113º CP) - tem de se fazer a acusação.


Depois procede-se à investigação coadjuvados com os órgãos de polícia criminal, seguida da acusação, provando nesta que houve crime e determinando o agente do crime. Se não se provar que houve crime e quem é o seu agente procede-se ao arquivamento; terminando, aqui o trabalho do MP. O julgador, em sede de julgamento, julga pelo que consta da acusação do MP – vinculação temática do tribunal, só podendo julgar o arguido pelos factos constantes da acusação.
Para além do princípio da acusação, importa o princípio da investigação. Aqui, ao juiz compete o princípio da investigação, tendo um papel activo no processo. Este pode promover todas as diligências necessárias à descoberta da verdade material, como no caso de todas as provas produzidas não terem sido suficientes para o juiz formar a sua convicção dos factos.

Aqui, ainda temos a existência de sujeitos processuais, que em sentido amplo podem dividir-se em:
· verdadeiros sujeitos processuais (juiz, advogado, arguido, MP); são os que têm uma participação activa com vista a ajudar o tribunal à descoberta da verdade material.
· meros participantes processuais (funcionários judiciais, testemunhas, peritos); distinguem-se dos verdadeiros sujeitos processuais, porque não obstante a sua participação ser decisiva, esgota-se num só acto (próprio).

O que se visa atingir é a verdade material, sendo desde logo uma verdade que se obtém no decurso do processo penal pelo recurso a métodos lícitos e legais como a prova. É uma verdade processualmente válida, que se consegue da contribuição da acusação e da defesa, e da possibilidade do juiz promover as diligências necessárias para a descoberta da verdade material.
Neste modelo todas as finalidades do processo penal têm de ser respeitados.

FONTES DO PROCESSO PENAL:
· Código de Processo Penal (1987) e Código Penal
· Normas de processo penal em legislação avulsa que por exemplo derrogam as normas do CPP
· Constituição da República Portuguesa
· Finalidades do processo penal

LACUNAS E MODO DE INTEGRAÇÃO:
A analogia é proibida em Direito Penal, salvo em “bonem partem”, sendo esta possível em processo penal – artigo 4º CPP. Quando não for possível resolver por analogia, recorre-se às normas do processo civil que se harmoniza com o processo penal, ou na falta destes, aplicar os princípios gerais do processo penal, que tem uma função de integrar as lacunas sempre que tal seja possível; e por outro lado, em concreto tem de impedir a aplicação das normas do processo civil.
Tradicionalmente dizia-se que o princípio de legalidade valia para o Direito Penal substantivo; entende-se hoje que deverá valer para o processo penal. Deste modo, sempre que o recurso à analogia agravar a situação do processo penal do arguido deverá ser recusada. Assim, a aplicação espacial está prevista no artigo 6º CPP e a aplicação temporal no artigo 5º CPP.



PRINCÍPIOS GERAIS DO PROCESSO PENAL:
Estes têm uma função muito importante, nomeadamente em matéria de integração de lacunas. Assim, têm uma função negativa, porque deverão ser eles a integrar as lacunas, sempre que tal seja possível; e uma função positiva, porque em concreto deverão ser eles a impedir a aplicação das normas do processo civil.
Estes princípios visam, num caso concreto, impedir a aplicação das normas do Direito Civil.

1. Princípios relativos à promoção processual
1.1. Princípio da Oficialidade
Este princípio visa responder a 2 questões: por um lado, a questão de saber a quem compete a iniciativa de investigar a prática de uma infracção, dando deste modo, o início ao processo e, por outro lado, saber a quem compete a decisão de submeter ou não a causa do julgamento?
Este princípio quer significar que a iniciativa do processo cabe a uma entidade pública estadual cabendo-lhe, igualmente, a decisão de submeter ou não a causa a julgamento. Isto deve-se ao facto de o Direito Penal ser entendido como um direito de bens fundamentais da comunidade, como por exemplo a protecção da ordem social e, por tudo isto, deva ser independente da actuação e da vontade de quaisquer particulares, pois só assim podem ser levadas a cabo as funções do processo penal que constituem uma exigência irrenunciável das sociedades modernas.
Entre nós, é em regra ao Ministério Público (MP) que cabe a iniciativa de investigar a prática de um crime e a decisão de submeter ou não a causa a julgamento, isto é, cabe-lhe, nos termos do artigo 48º CPP “promover o processo penal…”, após a aquisição da notícia do crime (artigo 241º CPP), cabendo-lhe igualmente, receber as denúncias, queixas e participações e apreciar o seguimento a dar-lhes (artigo 53º, nº 2, al. a) CPP). Uma vez investigada a notícia do crime, na fase de inquérito (artigo 262º, nº 1 CPP), é ainda ao MP que cabe decidir, depois de determinada esta fase, a acusação ou o arquivamento do processo – artigo 276º, nº 1 CPP.
Sendo esta a regra, certo é que comporta algumas limitações e excepções no nosso direito processual penal actual. Limitações que derivam da existência de crimes semi-públicos e excepções que derivam da existência de crimes particulares.
Dizem-se crimes públicos, aqueles em que MP promove, oficiosamente e por sua própria iniciativa, o processo penal e decide, embora respeitando o princípio da legalidade, a submissão ou não da causa a julgamento. Em relação a estes, vale inteiramente o princípio da oficialidade.
Dizem-se crimes particulares em sentido amplo, aqueles em que a legitimidade do MP para promover o processo precisa de ser integrada por uma queixa do ofendido ou de outras pessoas, referidas no artigo 113º CP e ainda aqueles em que o titular desse direito depois da queixa se constitua assistente e deduza acusação particular, caso queira que o facto seja submetido a julgamento – artigo 50º, nº 1 e 285º, nº 1 CPP. Os primeiros são considerados crimes semi-públicos e os segundos são considerados crimes particulares em sentido estrito.
Nos crimes particulares em sentido estrito é o particular que decide a investigação da prática da infracção, e também, sobre a submissão da mesma a julgamento. Deste modo, constituem uma verdadeira excepção ao princípio da oficialidade.
Os crimes semi-públicos comportam apenas uma limitação, na medida em que o MP continua a decidir, autonomamente, sob a submissão ou não da infracção a julgamento.
Este princípio da oficialidade responde a 2 perguntas: a quem compete a iniciativa do processo penal? A quem compete a submissão ou não da causa a julgamento?
A regra é a de ser o MP, nos crimes públicos onde vale o princípio da oficialidade por inteiro. A esta regra temos limitações, crimes semi-públicos onde vão limitar a resposta à 1ª pergunta deste princípio; e excepções, crimes particulares, onde o MP fica condicionado à vontade particular.
Nos crimes públicos vale o princípio da oficialidade por inteiro, pois ao adquirir a notícia do crime, o MP investiga. Finda a investigação, o MP pode acusar ou arquivar o processo.
Os crimes semi-público são um limite ao princípio da oficialidade, pois o MP não pode investigar sem que haja queixa do ofendido ou das pessoas do artigo 113º CP. A partir do momento em que haja queixa, tudo se passa como se tratasse de um crime público.
Os crimes particulares são uma excepção ao princípio da oficialidade. Os requisitos são a queixa do ofendido ou das pessoas do artigo 113º CP. O MP investiga e pode chegar à conclusão que houve crime, notifica a pessoa que apresentou queixa para esta se constituir assistente, para deduzir acusação particular.
Como sabemos que um crime é particular?
Na parte especial do Código, artigo 131º CP ss, a regra é que este crime é público. Quando nada se diz na letra da lei é porque o crime é público. Mas, temos de ter em atenção os outros artigos do capítulo.
Nos artigos 163º e 164º CP, a letra da lei nada diz, e por isto à partida serão crimes públicos. Todavia, temos de ver, ao longo do capítulo, se há alguma norma específica – o artigo 178º CP, vem dizer que o procedimento criminal para esses crimes depende de queixa, logo em princípio, serão crimes semi-públicos. Este artigo ressalva para 2 situações: suicídio ou morte da vítima, quando o crime tiver sido praticado contra menor de 14 anos. Nestas situações, o procedimento criminal não depende de queixa, logo serão crimes públicos.
A injúria prevista no artigo 181º CP, à partida será um crime público. Todavia o artigo 188º CP, diz que o procedimento criminal depende de acusação particular. Logo, é um crime particular. O mesmo artigo diz que para os crimes do artigos 184º e 187º CP não é necessário acusação particular. Logo, este artigo 187º CP é um crime semi-público.

1.2. Princípio da Legalidade
Este princípio significa que o MP está obrigado a promover o processo penal, abrindo o inquérito sempre que tenha adquirido a notícia do crime – artigo 241º CPP, e a deduzir acusação sempre que tiver recolhido indícios suficientes de se ter verificado o crime e de quem é o seu agente. Deste modo, verifica-se que não há lugar a qualquer juízo de oportunidade sobre a promoção ou prossecução do processo penal, na medida em que o dever do MP, uma vez verificadas certas condições, é promover o processo penal.
A actividade do MP está estritamente vinculada à lei, daí deve falar-se, em princípio, da legalidade e não em considerações de oportunidade de qualquer ordem (político, financeira, social).
Este princípio tem como consequência no que respeita à acusação pública, o princípio da imutabilidade segundo o qual não pode ser retirada a partir do momento em que o Tribunal foi chamado a decidir sobre ela. Aqui, terá que se excluir a renúncia à acusação como desistência dela, exceptuando-se os crimes particulares em sentido amplo, onde é possível, tanto a renúncia como a desistência desde que exista acordo com o arguido, até à publicação da sentença de 1ª instância.
Uma outra consequência deste princípio é a denúncia obrigatória ao MP, por parte das entidades policiais quanto aos crimes que tenham conhecimento – artigo 242º, nº 1, al. a) e b) CPP. Existe, ainda, a denúncia facultativa, por qualquer pessoa, relativamente a todo o crime de que tenha notícia, desde que o procedimento respectivo não dependa de queixa – artigo 244º CPP.
Este princípio constitui um dos alicerces fundamentais de um Estado de Direito Democrático, tentando evitar que a Justiça Penal seja ferida de parcialidade e arbítrio, pois se fosse possível aos órgãos públicos encarregados do processo penal apreciar da “conveniência” do seu exercício e omiti-lo por inoportuno”, aumentaria o perigo de aparecimento de influências externas de ordem diversa da Administração da Justiça Penal, levando a uma diminuição da confiança naquela Administração.
O princípio da legalidade liga-se ao princípio da igualdade na aplicação do direito, ganhando directa incidência jurídico-constitucional no artigo 13º CRP. Todavia, o princípio da legalidade pressupõe a existência de algumas limitações no sentido de oportunidade, podendo mesmo falar-se, para certos domínios e sobre certas possibilidades de controlo de princípio da oportunidade. Nesse sentido devemos falar nos artigos 280º e 281º CPP.
Uma vez verificados todos os requisitos que condicionam a sua aplicação, eles assumem-se como verdadeiras alternativas ao despacho de acusação. Assim, não obstante o MP ter recolhido, durante inquérito, indícios suficientes de se ter verificado o crime e quem foi o seu agente, ele não submete a causa a julgamento: arquiva ou suspende provisoriamente o processo. Estas normas assumem uma alternativa à acusação e reportam uma certa margem de oportunidade do MP.
O artigo 280º CPP, diz que a dispensa de pena consiste no facto de o agente ter praticado um facto ilícito culposo, mas não obstante isso, o juiz dispensa-o por considerar que não se verificam os pressupostos indispensáveis à verificação da pena. Isto acontece na pequena criminalidade (até 6 meses). A justificação da existência deste artigo, prende-se com alguns princípios politico-criminais, como sejam razões de ordem pragmática. Se o MP chegar à conclusão que aquele processo irá terminar numa dispensa de pena pode decidir, logo ali, pelo arquivamento. Recorre-se a este mecanismo em nome da ideia de prevenção social visando a ressocialização do indivíduo.
O artigo 281º CPP tem um âmbito de aplicação diferente do artigo 280º CPP, pois enquanto este último vale para a pequena criminalidade, o artigo 281º CPP vale tanto para aquela como para a média criminalidade. Aqui, o MP, quando chega ao fim do inquérito, em vez de acusar suspende provisoriamente o processo, tendo em conta as alíneas do nº 1 do artigo 281º CPP. Trata-se de uma solução consensual bastante alargada, na medida em que se exige o acordo entre o arguido, o assistente e o juiz de instrução.
Isto, só se aplica a arguidos primários, ou seja, que não tenham antecedentes criminais. Esta solução tem ainda a possibilidade de poder aplicar certas injunções ou regras de conduta ao arguido – artigo 281º, nº 2 CPP. A solução deste artigo deve-se, essencialmente a:

- razão de ordem pragmática, no sentido de que não é necessário estar a sobrecarregar o juiz com este tipo de causas, visando-se com isso uma maior celeridade processual;
- à ideia de não estigmatização do arguido.

Segundo, Costa Andrade, a audiência de julgamento é um cenário degradante devendo, sempre que possível, não sujeitar o arguido.
Este artigo 281º CPP dá aplicação ao princípio político-criminal da necessidade penal. Estas injunções ou regras de conduta não são penas, na medida em que o MP não pode aplicar penas. Por outro lado, não tem carácter penal, pois necessitam da concordância do arguido. A figura da diversão (forma como por vezes estas normas são designadas em processo penal) é semelhante à figura da discriminalização em direito penal substantivo.
Estes 2 artigos (280º e 281º) são 2 formas de diversão, ou seja, um desvio ao procedimento normal no sentido em que só se aplicam caso o MP possa acusar, nos termos o artigo 283º CPP. Todavia, enquanto o artigo 280º CPP é uma forma de diversão pura e simples; o artigo 281º CPP é uma forma de diversão com intervenção, uma vez que ao arguido são impostas injunções ou regras de conduta.
Quando o MP suspende, nos termos do artigo 281º CPP, não é possível requerer a abertura da instrução, uma vez que, para se poder aplicá-lo é necessário a concordância do juiz de instrução. Não teria lógica que fosse requerida a abertura da instrução por quem já tinha manifestado a sua concordância.
A actuação do MP pode ser controlada através de 2 mecanismos: controlo judicial da sua decisão desencadeado pelo arguido quando requer a abertura da instrução relativamente a factos, pelos quais tenha sido deduzida acusação ou pelo assistente relativamente aos factos pelos quais o MP não tenha deduzido acusação – artigo 286º CPP; intervenção hierárquica, que tem lugar quando é proferido um despacho de arquivamento e não é requerida a abertura da instrução – artigo 278º CPP.

Aquisição
Fase obrigatória Notícia do Crime Acusa Fase facultativa (requerida)

Investigação
(inquérito)Ministério Público ----------------------- Instrução
Arquiva Fase judicial artigo 287º
CPP:
- despacho de pronúncia
(fase de julgamento)
- despacho de não pronúncia
(fase de arquivamento)



1.3. Princípio da Acusação
É um princípio caracterizador do processo penal, que tem assento constitucional no artigo 32º CRP.
De acordo com este princípio, a entidade que investiga e acusa deve ser distinta da entidade que procede ao julgamento, pois só assim pode ser garantida a imparcialidade do processo em causa. Assim sendo, o tribunal a quem cabe o julgamento não pode, por sua iniciativa, começar uma investigação tendente ao esclarecimento de um crime e à determinação dos seus agentes, uma vez que isso cabe a uma entidade diferente.
Este princípio é integralmente acolhido no nosso CPP; deste modo o conjunto de diligências que visa investigar a existência de um crime, determinar os seus agentes, bem como recolher provas em ordem à decisão sobre a acusação designa-se por inquérito – artigo 262º, nº 1 CPP.
Esta fase inicia-se com a aquisição da notícia do crime (artigo 241º CPP), cabendo, também, a esta magistratura a direcção do inquérito pelo artigo 263º CPP, bem como o encerramento deste através quer do arquivamento quer da acusação (artigo 276º CPP).
A dedução da acusação é pressuposto de toda a actividade jurisdicional da investigação, conhecimento e decisão, ou seja, o juiz julga e decide sobre uma infracção quando há uma acusação prévia do MP (artigo 283º CPP) ou excepcionalmente (artigo 303º, nº3; 309º, nº 1; 359º, nº 1 e 379º, al. b) CPP).
O efeito do caso julgado da decisão estende-se a todo o objecto do processo. Por exemplo: A, numa caixa de um banco decide tirar no dia 10 de Abril €100, devido a uma crise financeira que atravessava; 15 dias depois tira € 150 e fazendo o mesmo sempre que estava com dificuldades. Quando um crime é continuado aplica-se uma pena por todos os crimes, quando existem circunstâncias exteriores que arrastam o agente para a prática do crime, que leva a que haja uma diminuição da culpa. Segundo o princípio da unidade, o tribunal tem que conhecer tudo isto; pois se apenas conhecer o primeiro crime, de acordo com o princípio da consumpção, o juiz devia ter conhecimento de todo o processo; se não teve, tudo se passa como de facto tivesse tido.

2. Princípios relativos à prossecução processual
2.1. Princípio da Investigação
Com este princípio pretende-se traduzir o poder dever que ao tribunal incumbe de esclarecer e instruir autonomamente, mesmo para além das contribuições da acusação e da defesa, o facto sujeito a julgamento criando aquele mesmo as bases necessárias à sua decisão.
Este princípio dirige-se, primeiramente, ao conseguimento das bases da decisão, portanto, à matéria de prova, podendo por isso mesmo, designá-lo correctamente por princípio da verdade material, assim sendo, deverá ser tratado dentro dos princípios relativos à prova.

2.2. Princípio da Contrariedade
Sendo certo que cabe ao juiz, nos termos do princípio da investigação, cuidar em último termo do conseguimento das bases necessárias à boa decisão da causa não deve levar a cabo a sua actividade solitariamente ouvindo para tal quer a acusação quer a defesa. Não significa isto, que o juiz deve permanecer passivo ou ouvir o debate que perante ele se desenrole, isto só o deixaria compatibilizar-se com o sistema processual inteiramente acusatório e não com um sistema acusatório integrado pelo princípio da investigação. A prossecução processual deve cumprir-se, de modo a fazer ressalvar as contribuições quer da acusação quer da defesa; isto quer dizer igualmente que o juiz deve ouvir todos os participantes processuais (arguido, defensor, assistente, testemunha, perito e outros).
O princípio do contraditório está consagrado expressamente no artigo 32º, nº 5 CRP e encontra assento na legislação penal, embora de diferente forma, consoante o estado de desenvolvimento do processo:

- num primeiro momento, fase do inquérito; surge o princípio do contraditório de forma limitada pelo artigo 61º, nº 1, al. a), b) e f) CPP. O arguido goza do direito de estar presente em todos os actos processuais que directamente lhe disserem respeito, de ser ouvido pelo juiz de instrução sempre que deva tomar uma decisão que pessoalmente o afecte e o direito de intervir no inquérito oferecendo as provas e requerendo as diligências que se afigurem necessárias – artigo 69º, nº 1, al. a) CPP.
- segundo momento, na fase da instrução, a contrariedade manifesta-se no artigo 298º e 301º, nº 2 CPP.
- terceiro momento, fase de julgamento – artigo 327º; 321º, nº 3; 355º, nº 2 e 360º, nº 1 e 2 CPP.

Este princípio opõe-se de certo a uma estrutura puramente inquisitória do processo penal, onde o juiz pode proferir a decisão sem previamente ter confrontado o arguido com as provas que contra ele tivesse recolhido.

2.3. Princípio da Suficiência e Questões Prejudiciais
O processo penal é, em princípio, um lugar adequado ao conhecimento de todas as questões, cuja solução se revele necessária à decisão a tomar. Todavia no decurso do processo penal podem surgir questões de diversa natureza, por exemplo de natureza penal, civil, administrativa, fiscal e outras, cuja resolução é relevante para a resolução da questão principal. Por exemplo: há um crime de furto quando alguém se apropria de uma coisa alheia; neste caso pode vir a levantar-se a questão quanto à propriedade da coisa, estando, assim, perante uma questão civil, cuja resolução releva para a questão principal.
O artigo 7º CPP é uma concretização deste princípio, no entanto existem certas excepções relacionadas com as questões prejudiciais. Questões prejudiciais são aquelas que surgem no processo penal e têm natureza e objecto diferente da questão principal, caracterizando-se por:

· a sua resolução ser imprescindível para a resolução da questão principal
· poder ser uma questão autónoma, ser objecto de um processo autónomo daquele processo penal.
Podem surgir questões prejudiciais de vários tipos, isto é, de natureza penal, civil; questões incidentais não penais surgem, então, no processo penal.

A questão coloca-se no que respeita à competência material dos tribunais, existindo a este respeito 2 teses:
· ou se adopta a tese da resolução ou conhecimento obrigatório, segundo a qual sempre que surja uma questão prejudicial em processo penal, deverá esse tribunal penal conhecê-la obrigatoriamente;
· ou se adopta a tese da devolução obrigatória, segundo a qual se defende que sempre que surja uma questão em processo penal que não tenha carácter penal, deverá ser submetida a um tribunal competente.

A tese da resolução ou conhecimento obrigatório pode basear-se não só na exigência de que não se suscitem obstáculos à concentração e continuidade no processo penal, como ainda na intenção primária neste processo que é a descoberta da verdade material.
O seu único limite prende-se com a necessidade de respeito pela força do caso julgado, desde que se encontre já investida da decisão da questão prejudicial pelo tribunal especificamente competente para ela.
O artigo 7º, nº 2 CPP prevê situações em que se admite a devolução do processo para um tribunal competente. Só tem interesse a devolução, quando a questão prejudicial seja uma questão não penal, devendo obedecer aos seguintes pressupostos:
· que a questão seja de resolução necessária para se conhecer da existência de um crime;
· que a questão não possa ser convenientemente resolvida em processo penal.

2.4. Princípio do Processo da Concentração
Este princípio exige uma prossecução tanto quanto possível unitária e continuada de todos os termos e actos processuais; devendo um complexo destes, em todas as fases do processo, desenvolver-se na medida do possível concentradamente, quer seja no espaço quer seja no tempo. No que respeita ao espaço significa que o processo deve decorrer tanto quanto possível no mesmo sítio; no que respeita ao tempo deverá ser contínuo até ao seu final.
Este princípio ganha maior relevo no que respeita à audiência de discussão e julgamento, ligando-se aí aos princípios de forma enquanto corolário dos princípios de oralidade e mediação – artigo 328º, nº 1 CPP. O artigo 328º, nº 2 CPP mostra-nos que são admitidas as interrupções estritamente necessários para alimento e repouso dos participantes. O nº 3 deste artigo mostra-nos que o adiamento da audiência só será admitido quando não seja a simples interrupção suficiente. Este artigo 328º CPP distingue 3 situações:

· questão das interrupções para repouso e alimento dos participantes; aqui a audiência continua como se não tivesse havido interrupção;
· se o adiamento não for superior a 8 dias, também, aqui, a audiência se retoma, devendo o tribunal decidir se os actos já realizados ou alguns deles devem ser repetidos;
· se o aditamento for superior a 30 dias, a audiência terá sempre de ser recomeçada.
Em outros ordenamentos jurídicos é usual dizer-se que quando a audiência é adiada continua e, quando é interrompida recomeça. O nosso ordenamento não adopta uma forma tão radical ponderou antes as estritas ligações entre o princípio da concentração e o princípio da imediação.



3. Princípios relativos à prova
3.1. Princípio da Investigação ou da Verdade Material
Perante o acto inicial de promoção de qualquer processo dão-se fundamentalmente 2 possibilidades diferentes de construir a respectiva prossecução processual:
a) numa delas as parte podem dispor do processo como coisa ou negócio seu;
b) na outra será o tribunal a investigar, independentemente das contribuições dadas pelas partes, o facto sujeito a julgamento construindo autonomamente as bases da sua decisão; deste modo podemos apercebermo-nos facilmente da existência de 2 princípios a respeito desta matéria.
Assim temos, por um lado, o princípio do dispositivo, de contradição de discussão ou da verdade formal; e por outro lado, o princípio da investigação ou da verdade material.
Quando esteja em causa um processo presidido por o princípio da contradição ou discussão, será antes de tudo uma discussão sobre a existência ou inexistência de uma pretensão feita judicialmente pelo autor. Aqui, o juiz tem um papel meramente passivo, não é mais do que um árbitro perante o duelo das partes. É apenas às partes que compete a discussão do material do facto que vai servir de base à decisão. Assim sendo, na sua decisão o juiz apenas poderá ter em conta os factos alegados pelas partes e as provas por elas induzidas.
Deste modo, é sobre as partes que irá recair todo o risco de condução do processo através do ónus que sobre elas incide de afirmar, contradizer e impugnar. É a isto que se dá o nome de auto-responsabilidade probatória das partes.
O juiz terá de, perante isto, considerar não necessitados de prova todos os factos que apresentados por uma das partes não tenha sido contraditados por outra parte. Esses factos, embora possam não ser verdadeiros, são tomados como tal para efeitos de decisão, por isso se diz que a sentença procura a verdade formal, isto é, intraprocessual.
Com este princípio da contradição vem combinar-se o princípio do dispositivo, sendo o objecto do processo uma relação jurídica material disponível. Às partes pertence o direito de dispor do objecto do processo, quer pondo-lhe fim através da desistência da instância quer determinando o próprio conteúdo da sentença através do pedido de confissão de desistência e transacção. Diferente será o processo integrado pelo princípio da investigação, pois, aqui, o esclarecimento material do facto não pertence exclusivamente às partes, mas em último termo ao juiz. É sobre ele que recai o ónus de investigar e esclarecer oficiosamente, independentemente das contribuições das partes, o facto submetido a julgamento.
É pelo dever de investigação judicial que se compreende que não impeça nunca sobre a acusação ou a defesa em processo penal qualquer ónus de afirmar, contradizer ou impugnar. Aqui, procura-se não a verdade formal, mas a verdade material, a ser tomada num duplo sentido: primeiramente no sentido de uma verdade subtraída a qualquer influência que quer a acusação quer a defesa queira fazer sobre ela; mas também, no sentido de uma verdade que não sendo absoluta ou ontológica seja uma verdade judicial prática e processualmente válida.
Embora, este princípio valha inteiramente no processo penal português, poderá, porém, no entendimento de certos autores, apontar-se ao princípio uma tripla limitação:
da concorrência do princípio da acusação; só pode conceber-se como um limite ao princípio da investigação quando este se veja integrado numa estrutura de alguma medida inquisitória do processo penal, mas já não quando esteja em causa uma estrutura basicamente acusatória.
do princípio da legalidade dos meios de prova; a legalidade dos meios bem como as regras gerais de produção de prova e as respectivas proibições de prova são condições da validade processual da prova e por isso mesmo são critérios da própria verdade material. Parece que, perante isto, não pode entender-se como uma limitação ao princípio da investigação.
Da exclusão do conhecimento privado do juiz; também aqui, não pode entender-se como uma verdadeira limitação.



3.2. Princípio da Livre Apreciação da Prova
Com a produção da prova em julgamento visa oferecer-se ao tribunal as condições necessárias para que esta forme a sua convicção sobre a existência ou inexistência de factos e situações que revela para a sentença. A este propósito a questão que se coloca é a de saber se a apreciação da prova deve ter lugar na base de regras legais predeterminantes do valor a atribuir-lhe – sistema de prova legal; ou antes na base livre valoração do juiz e da sua convicção pessoal – sistema de prova livre.
Muitas legislações do passado, receosas de que o juiz incorresse em erro facilmente na valoração dos meios de prova entendiam dever adoptar o sistema de prova, onde a apreciação das mesmas assentava em regras da vida e experiência que, tradicionalmente eram tidas como seguras, e, através das quais se fixava e hierarquizava o valor dos diversos meios de prova.
Parece assentar o valor atribuído pelo processo canónico medieval na confissão. Todavia, após as reformas legislativas do processo penal, consequentes à Revolução Francesa, se entendeu que o valor e a força dos meios de prova não podem de uma forma correcta aferir-se à priori, mas apenas tendo especial atenção às circunstâncias concretas do caso, favorecendo este entendimento.
Pode referir-se a existência, no séc. XIX, da Instituição do Júri como entidade competente para a apreciação da prova em processo penal. Por outro lado, pode falar-se no aparecimento e difusão dos chamados métodos científicos de prova que permitiram reduzir a margem de erro na apreciação livre da respectiva prova.
Em Portugal, o sistema de prova livre surgiu nas reformas judiciárias da 1ª metade do séc. XIX, saídas da Revolução Liberal. Actualmente o princípio da livre apreciação da prova está consagrado no artigo 127º CPP, tendo relevo em todo o decurso do processo penal e para todos os órgãos de administração de justiça penal.
Falar em livre valoração da prova quer significar, por um lado a ausência de critérios predeterminados do valor a atribuir à prova e, por outro lado, quer significar que não pode haver uma valoração arbitrária da prova em causa, devendo a livre apreciação da prova ser uma liberdade que tem por limite o dever de perseguir a verdade material. A convicção do juiz não pode ser puramente subjectiva e emocional, deverá ser uma convicção pessoal, mas também objectivável e motivável.
Não obstante ser este o princípio que, em regra, vale no nosso direito, terão que se conhecer algumas excepções:
Relativamente à prova testemunhal; este princípio vale sem quaisquer limitações – artigo 128º CPP, excepto em testemunho de ouvir dizer ou testemunho indirecto do artigo 129º CPP, em relação ao seu campo de eleição.
Outra situação é a que se refere às declarações do arguido quanto aos factos que lhe são imputados, os confesse ou nada diga sobre eles. A negação fica submetida por inteiro ao princípio da livre apreciação da prova. Este princípio só vale, porém em matéria de confissão quando o crime for punível com pena de prisão superior a 5 anos.
À confissão livre, integrada e sem reservas do arguido por crime punível com pena de prisão até 5 anos correspondem os efeitos previstos no artigo 344º, nº 2 CPP, que concretiza uma limitação ao princípio da livre apreciação da prova. Relativamente ao silêncio do arguido, a lei contém uma verdadeira limitação à livre apreciação na medida em que aquela nunca pode desfavorece o arguido – artigo 343º, nº 1; 345º; e 61, nº 1, al. c) CPP.
Em suma: quanto às declarações dos arguidos, as referentes à sua identificação terão estes de responder com a verdade e obrigatoriamente. Já quanto às declarações relativas aos factos que lhe são imputados, podem os arguidos ou negar ou confessar ou mesmo nada dizer. Só neste caso incide o princípio da livre apreciação da prova, podendo o arguido negar os factos (mentir) não tendo de dizer a verdade, pois nem sequer está sobre juramento. Quanto ao facto de o arguido invocar o direito ao silêncio, sendo uma limitação ao princípio da livre apreciação da prova, não pode o juiz entende-lo em desfavor do arguido bem como não pode agravar-lhe a pena por ter exercido este direito que lhe assiste, resultando este direito da dignidade da pessoa. Outro caso é a confissão, em que primeiramente importa saber a punição do crime em questão; pois se a pena for inferior a 5 anos, estamos perante um limite ao princípio da livre apreciação da prova, desde que a confissão seja livre, integral e sem reservas, tendo depois os efeitos previstos nos artigos 344º, nº 2 CPP. Portanto, o juiz aceita a confissão e dispensa a restante produção da prova, ou seja, vai-se provar os factos, e por isso um limite ao princípio, não se valorando a prova com uma convicção objectivável e motivável. Depois as alegações finais com fim de determinar a sanção aplicável, reduzindo-se de seguida a taxa de justiça para metade. A isto, temos uma excepção: se houver na confissão co-arguidos, verificando-se uma confissão com reservas e não sejam estas coerentes aplica-se o princípio da livre apreciação da prova. Quanto à al. b) do mesmo artigo o juiz valora como entender. A al. c) diz-nos que crimes punidos com penas superiores a 5 anos o juiz vai aceitar a confissão, depois valorá-la conforme a sua convicção objectivável e motivável juntando a esta as outras provas produzidas. Se a confissão, desde logo, for feita sobre coacção e com reservas vai valer o princípio da livre apreciação da prova inteiramente, sendo esta a regra para os crimes com pena superior a 5 anos.
Em matéria de prova pericial; o juiz, embora mantendo inteira liberdade de apreciação de base ao facto pressuposto pelo perito, só pode divergir do juízo contido no parecer do perito desde que fundamentando devidamente a divergência se, também, ele puder fazer uma apreciação técnica, científica o artística ou se se tratar de um caso inequívoco de erro – artigo 163º CPP.
Quanto aos factos constantes de documento vale o princípio da livre apreciação da prova, mesmo se se tratar de um documento autêntico (escritura pública lavrada na presença de um notário) ou autenticado (caso de uma cópia estar em conformidade com o original) podendo o tribunal em qualquer caso declarar um documento junto aos autos como falso – artigo 169º e 170º CPP.
Em suma: quanto a este princípio podemos afirmar que temos 2 sistemas; e o sistema legal não é mais do que um enquadramento da prova nos critérios predeterminados; não aceitando o nosso Código este sistema, mas sim o sistema de prova livre. A valoração da prova não pode ser feita “à priori”, mas sim sempre em juízo, a contrário do que acontece no Direito Civil. Assim, o juiz valora a prova de acordo com a sua convicção pessoal, objectivável e motivável com vista à obtenção da verdade material.
Quanto às excepções temos em primeiro lugar os testemunhos de ouvir dizer (artigo 129º CPP), como limitação ao princípio da livre apreciação de prova. Outra limitação é o caso da confissão livre e integral nos crimes puníveis com pena de prisão não superior a 5 anos, com os efeitos do artigo 344º, nº 2. Uma outra consiste na matéria pericial, onde o juiz só pode divergir do perito fundamentando devidamente a divergência e se tiver conhecimentos próprios para tal ou se tratar de caso de erro inequívoco (artigo 163º CPP). Uma outra excepção ao princípio deve-se aos factos constantes de documento valendo o princípio da livre apreciação de prova, até mesmo documento autêntico ou autenticado, podendo declará-lo como falso (artigo 169º e 170º).

3.3. Princípio “in dubio pro reo”
Em processo penal, ao contrário do que acontece em processo civil, onde é às partes que compete a produção dos meios de prova necessários à decisão, recaindo igualmente sobre elas todo o risco da condução do processo em matéria probatória; é ao juiz que compete em último termo, oficiosamente, o dever de intervir e esclarecer o facto sujeito a julgamento, não existindo um verdadeiro ónus de prova que recai sobre o acusador ou arguido. Não existe o chamado ónus da prova formal, segundo o qual as partes teriam o dever de produzir as provas necessárias e confirmar as suas acusações de facto, sob pena de não verem os respectivos factos serem tidos como provados.
Atendendo ao princípio da investigação, pode entender-se que todos os factos relevantes para a decisão, que apesar da prova recolhida não possam ser subtraídos à dúvida razoável do tribunal, também, não possam ser considerados como provados. Por outro lado, se o referido princípio da investigação permite ao tribunal, em último termo, reunir as provas necessárias a uma boa decisão da causa, se pode compreender que a falta delas não possa de modo algum desfavorecer a posição do arguido, mas terá sempre que ser valorado a favor dele.
Este princípio “in dubio pro reo” funda-se constitucionalmente no princípio de presunção de inocência até ao trânsito em julgado da sentença de condenação valendo apenas em relação à prova de questão de facto e não a qualquer dúvida suscitada dentro da questão de direito. Relativamente ao facto sujeito a julgamento, este princípio aplica-se sem qualquer limitação, abrangendo quer os elementos fundamentadores e agravantes da incriminação, bem como as causas de exclusão da ilicitude e de culpa; quer às condições objectivas de punibilidade, bem como todas as circunstâncias relevantes em matéria de determinação de medida da pena. Em todos estes casos, a prova tem de actuar em sentido favorável ao arguido.
Como excepção ao princípio “in dubio pro reo” temos “in dubio contra reo”, que é usual apontar-se certos tipos de crimes – artigo 164º e 165º CP, nos quais o não conseguimento da prova de certos factos ou circunstâncias actua em desfavor do arguido. Não significa este facto a existência de uma presunção de culpa, até porque tal seria constitucionalmente ilegítimo à luz do princípio de presunção de inocência, mas apenas que certos tipos de crime é posto a cargo do agente um certo tipo de risco pela mesma conduta. Aqui, se o arguido não conseguir provas decide-se contra este.
O princípio “in dubio pro reo” é um princípio geral do processo penal pelo que, a sua violação conforma uma autêntica questão de direito que cabe na cognição do Supremo Tribunal de Justiça e das Relações, ainda que estas conheçam apenas de direito. Em relação a este facto é erro comum na nossa jurisprudência, tal como resulta do Acórdão do STJ de 16 de Novembro de 1996, dizer que o princípio “in dubio pro reo” é um princípio natural de prova, e como tal é estranho à competência dos tribunais superiores que conheçam exclusivamente matéria de direito.

Em suma;
este princípio não significa que em caso de dúvidas para além do razoável se proceda à absolvição, decidindo-se no sentido mais favorável ao arguido, na maioria das vezes sendo esta decisão incompatível com a absolvição. Este princípio é um corolário do princípio da presunção de inocência pelo disposto no artigo 32º, nº 5 CRP, pois em processo penal o juiz em nome do princípio da investigação pode promover todos os meios para a formação da sua convicção. Depois de todo o percurso estar finalizado ainda subsistir dúvidas para além do razoável deve o juiz decidir no sentido mais favorável ao arguido, quanto às questões de facto (os factos levados a prova) e não de direito (todo o processo e aplicação das normas).
Violar este princípio consubstancia uma questão de direito, não existindo aqui em processo penal o duplo grau de recurso, mas sim o recurso pré-salto, ou seja, uma questão de direito vai para o Supremo e uma questão de facto vai para a Relação, comportando algumas excepções.

4. Princípios relativos à forma
4.1. Princípio da Publicidade
Nos termos dos artigos 211º CRP e 321º CPP, as audiências dos tribunais são púbicas, devendo entender-se de acordo com o artigo 86º, que a publicidade do processo penal implica a assistência pelo público em geral à realização dos actos processuais, à narração dos actos processuais ou à reprodução dos seus termos pelos meios de comunicação social e, a consulta do acto, obtenção de cópias, extractos e certidões de quaisquer partes dele.
Todavia, isto não significa que a publicidade do processo coincida temporalmente com a audiência do julgamento, uma vez que por força do artigo 86º, nº 1, “o processo penal é, sob pena de nulidade, público a partir da decisão instrutória ou, se a instrução não tiver lugar do momento em que já não pode ser requerida”. O processo penal só é punido a partir da decisão instrutória ou se a instrução não tiver lugar quando já não possa ser requerida.
Sendo entendimento geral que o processo penal desempenha uma função comunitária que é assunto da comunidade jurídica, é possível assim, compreender a sua publicidade como uma forma de dissipar de quaisquer desconfianças que se possam suscitar sobre a independência e a imparcialidade com que é exercida a justiça penal.
Ao ser dada publicidade à audiência de julgamento, tanto o interesse da comunidade como do próprio arguido convergem no sentido da publicidade constituinte para todos uma verdadeira garantia. Isto não significa que estes dois interesses corram sempre em paralelo, por vezes podem conflituar no caso concreto, surgindo por isso a necessidade de introduzir limitações ao princípio.
A função de controlo da administração da justiça, que por vezes se atribui ao público, tem sido encarada com o maior cepticismo, pois aos ouvintes falta na maioria das vezes um conhecimento necessário ao correcto entendimento da tramitação e decisão processuais. Por sua vez, a questão de facto está quase sempre ao alcance o entendimento de um cidadão médio.
Como é sabido, se por um lado o princípio da publicidade da audiência traz inúmeras vantagens, por outro lado pode acarretar largos inconvenientes. Daí que se compreenda e se possa aceitar excepções dentro de determinados limites exactamente fixados.
1. Assim, no que concerne à audiência em relação a ouvintes e espectadores surgem desde logo excepções a este princípio no artigo 206º CRP, “para salvaguardar das pessoas e da moral pública”; e artigo 87º, nº 2 e 3 CPP, quando é “de presumir que a publicidade causaria grave dano à dignidade das pessoas e moral pública” e “em caso de processo por crime sexual que tenha por ofendido um menor de 16 anos”.
Nestes casos, os actos processuais ocorrem com exclusão da publicidade. Esta exclusão não deve, todavia, abranger a leitura da sentença – artigo 87º, nº 5 CPP. Terá, ainda que se distinguir destes casos aquelas situações em que o juiz impede a assistência de determinadas pessoas, atendendo à sua qualidade (menor de 18 anos) ou ao seu comportamento (atentatório da dignidade ou disciplina do acto). Aqui, não se deve falar em exclusão ou restituição da publicidade – artigo 87º, nº 6 CPP.

2. No que respeita à fase do princípio da publicidade que se liga aos órgãos de comunicação social, a questão é um pouco mais complexa. O critério geral da sua solução seria dar considerável liberdade aos órgãos de informação, impondo-lhes, todavia, um limite inultrapassável (o de daí não resultar um sensível perigo para a consistência e a eficácia do direito de defesa do arguido ou a prestação punitiva do Estado). Deverá, igualmente acautelar-se os interesses ligados à reserva de intimidade da vítima do crime.
Este perigo é muito frequente, podendo assumir diversas formas de constituir uma das maiores violações dos princípios basilares do Direito Processual Penal. Em consequência dos relatos, por vezes, sensacionalistas, os órgãos de comunicação social acabam muitas vezes por causar prejuízos irremediáveis à presunção de inocência do arguido – garantias do processo criminal disposto no artigo 32º CRP.
O Código de Processo Penal procura equilibrar os diferentes interesses em jogo, proibindo sob pena de desobediência simples a reprodução de peças processuais incorporadas em processos pendentes, quando para tal não tenha sido obtida a conveniente autorização. Proíbe igualmente a transmissão de determinadas margens ou de tomadas de som, salvo se existir autorização competente. A publicação da identidade da vítima dos crimes sexuais contra a honra ou reserva de intimidade da vida privada é antes da autorização ou depois se o ofendido for menor de 16 anos por força do artigo 88º, nº 2 CPP.

4.2. Princípio da Oralidade e da Imediação
Ao contrário do que acontece no processo penal de estrutura inquisitória, o processo penal de estrutura acusatória mostrou-se favorável a um sistema de oralidade e da audiência de julgamento que entendia ser favorável ao conseguimento de uma justa decisão. Assim sendo, importa referir que, também, o processo penal português passou, desde o séc. XIX, a ser regido por este princípio, sendo isto claro actualmente em várias normas positivas ou resultante de preceitos que supõem uma actividade processual exercida na presença dos participantes processuais, isto é, oralmente nos termos dos artigos 96º; 398º; 340º; 350º; 355º; 363; e 422º CPP.
Todavia, não basta ao princípio da oralidade que no processo penal ocorram actos que se processa sob a forma oral, pois se assim fosse, difícil seria encontrar depois da descoberta da escrita um processo que não fosse oral. Mesmo no mais puro processo inquisitório não faltam actos processuais orais entre o inquisidor por um lado, e as testemunhas e arguido e outros por outro lado.
Podemos, então, apercebermo-nos que a oralidade não significa a exclusão da escrita no sentido da proibição de que os actos que tenham lugar oralmente fiquem em registos, protocolos ou actas.
Ao falar-se da oralidade como princípio geral do processo penal visa-se a forma oral de atingir a decisão de modo a que o tribunal se aperceba com clareza e relativa rapidez do material que vai servir de base à boa decisão da causa. Permite ao tribunal aperceber-se e reflectir sobre a personalidade do arguido bem como em virtude as suas declarações aferir da sua credibilidade, tal como os restantes participantes processuais.
Falar-se de imediação quer significar a relação de proximidade comunicante entre o tribunal e os sujeitos processuais, significando esta proximidade a situação por exemplo da vídeo-conferência.

Quanto aos sujeitos processuais; o processo penal consiste numa sequência de actos juridicamente pré-coordenados, praticados por determinadas pessoas legitimamente autorizadas com vista a investigar a prática de um crime bem como as suas consequências atendendo a uma justa decisão.
No processo intervém várias entidades desde órgãos de administração da justiça, órgãos da polícia criminal, particulares, agentes da polícia, funcionários judiciários e outros; que de uma forma ampla podem designar-se por participantes processuais. Todavia, dentro destes será conveniente distinguir aqueles a quem cabe a prática de actos singulares, que se esgota na própria actividade do processo; daqueles outros que são portadores de um conjunto de direitos autónomos tendentes a uma conformação da concreta tramitação do processo em um todo com vista à decisão final.
No primeiro caso estamos perante meros participantes processuais, sendo estes os que colaboram no processo, mas não têm a faculdade de iniciativa e decisão nesse mesmo processo, como no caso dos agentes de polícia, testemunhas, peritos e funcionários judiciais.
No segundo caso, estamos perante os verdadeiros participantes processuais, portadores de um conjunto de poderes deveres que lhes permite uma atenção no processo de modo a co-determinar a decisão final que venha a ser proferida, isto é, conduzem activamente o processo, é exemplo disso o juiz, Ministério Público, arguido, defensor e o assistente.



TRAMITAÇÃO PROCESSUAL:


PROCESSO PRELIMINAR:
· Notícia do Crime
O procedimento inicia-se com um acto do Ministério Público, por força do artigo 48º e 53º CPP; e, também, artigo 211º, nº 1 CRP. A falta de proporção do Ministério Público constitui uma nulidade insanável – artigo 119º, nº1, al. b) CRP. Para que o Ministério Público possa proceder à abertura do processo, torna-se necessário que tenha informação de que tenha perpetrado um crime podendo obter a notícia de vários modos como seja por conhecimento próprio ou por intermédio dos órgãos de polícia criminal ou por denúncia (artigo 248º CPP).
A notícia do crime é exterior ao procedimento, uma vez que este só se inicia com o acto de produção do Ministério Público. Sendo a notícia de grande importância, nem sempre o Ministério Público terá de promover o processo perante a eventual informação da prática do crime, por exemplo o caso em que a notícia não merece credibilidade como é o caso das denúncias anónimas onde, por vezes se torna necessário haver investigação prévia no sentido de testar a credibilidade da própria notícia antes de promover o processo, estamos perante o nível da actividade prévia processual de grande importância para o procedimento sendo, também, designado de medidas cautelares e de polícia, tratando-se aqui de actos praticados pelas polícias ainda antes de se iniciar o procedimento, mas importantes para fundamentar a notícia do crime e para a prova.
Competindo ao Ministério Público promover o procedimento, para poder fazê-lo, deverá obter a notícia do crime quer directa ou indirectamente. O Ministério Público obtém directamente a notícia do crime quando ele próprio constata o facto que constituem indícios a prática de um crime e por outro lado, colhe-a indirectamente quando a notícia lhe é transmitida por terceiros. Esta última pode fazer-se formal ou informalmente e a atitude do Ministério Público pode, também, ser diversa consoante a forma como a notícia do crime lhe sejam transmitidas. Se a notícia é transmitida ao Ministério Público na forma estabelecida por lei, ele deve percorrer necessariamente o procedimento, mas se é transmitida de modo informal, só o deverá fazer se se convencer da seriedade da notícia e depois de se certificar que a notícia o é efectivamente.

· Formas Legais da Notícia do Crime
O artigo 241º CPP diz que o Ministério Público adquire a notícia por conhecimento próprio, por intermédio dos órgãos de polícia criminal ou por denúncia, a diferença legal pode reduzir-se a duas formas conhecimento próprio ou denúncia.
Quando estamos perante uma denúncia, a lei trata o conhecimento obtido através dos órgãos de polícia criminal como uma subespécie de denúncia podendo estes obtê-la igualmente por conhecimento próprio ou por terceiro.
A aquisição da notícia por parte do Ministério Público, os rumores públicos, as notícias anónimas, as notícias dos meios de comunicação social. Qual o tratamento a dar-lhes?
Esse conhecimento próprio pode ser directo ou indirecto. É do conhecimento directo o que é obtido de uma forma imediata por percepção sensorial dos factos constitutivos dos crimes, porém a expressão tem um conteúdo mais amplo. Não só o do conhecimento directo, mas também aquele que é obtido por qualquer meio que não pelos expressamente disciplinados pela lei, isto é, aquele que não é provocado por intermédio dos órgãos de polícia criminal ou por denúncia. O conhecimento próprio do crime do Ministério Público pode resultar da sua percepção directa, da sua notoriedade, de rumores públicos, de informação reservada e de informação que não resista às características de denúncia.
O Ministério Público que adquira directamente a notícia da prática de um crime público, promove o respectivo processo sendo para tal competente; ou denuncia-se o crime ao Ministério Público de um modo indirecto não formal. É o que sucede com os rumores públicos, com as notícias anónimas e com as notícias difundidas pelos meios de comunicação social.
Com efeito, o Ministério Público pode ter conhecimento de que há rumores da prática de um crime sem que dele conheça indícios. Em regra, os simples rumores não determinarão a proporção de um processo. Antes deverão ser objecto de investigação de natureza meramente policial no sentido da sua confirmação e da obtenção de indícios credíveis. De um modo semelhante, quando a notícia do crime é transmitida anonimamente ao Ministério Público, essa notícia não pode merecer credibilidade podendo, também, suceder que em razão das características da notícia ainda que anónima, se justifique uma actividade preliminar do processo ainda de natureza policial no sentido de se apurar a eventual existência de indícios.
Também, no que respeita à notícia do crime publicitadas pelos meios de comunicação social não é obrigatório pelo Ministério Público abrir um processo perante quaisquer notícias da eventual prática do crime publicitadas pelos órgãos de comunicação social. Tudo depende da credibilidade que a notícia pareça ao Ministério Público. Se a notícia dos meios de comunicação social for tecer indícios credíveis da eventual prática do crime, o Ministério Público deve iniciar o procedimento.

· Aquisição da notícia do crime pelos órgãos de polícia criminal
Deverá distinguir-se da notícia que é obtida através dos órgãos da polícia criminal, a que é obtida directamente por estes ou que resulte de denúncia que lhes é feita por terceiros (artigo 245º e 248º CPP). A notícia pode ser adquirida por conhecimento próprio (artigo 248º, nº 1 CPP), devendo esta ser transmitida ao Ministério Público no mais curto espaço de tempo. A lei distingue órgãos de polícia criminal das entidades policiais, pois nem todas as entidades policiais são órgãos de polícia criminal, nem os órgãos de polícia criminal são entidades policiais, como resulta dos artigos 1º, nº 1, al. c) e 213º, nº 1 CPP. O artigo 1º, nº 1, al. c) CPP dispõe que se consideram órgãos de polícia criminal todas as entidades e agentes policiais a quem caiba levar a cabo quaisquer actos ordenados por uma autoridade judiciária ou que seja determinado pelo Código essas entidades e agentes policiais, dependendo das expectativas estatuárias. Assim, há entidades que são órgãos da polícia criminal e não são estatutariamente agentes policiais; e entidades policiais que não são órgãos de polícia criminal.

· Denúncia
É a denúncia a transmissão ao Ministério Público do conhecimento de factos com eventual relevância criminal na forma estabelecida por lei para efeitos de procedimento criminal. Para que o Ministério Público tome conhecimento de factos com eventual relevância criminal, é importante que a notícia lhe seja fornecida. Para tal, a lei conta com a colaboração dos cidadãos em geral e impõe essa colaboração a todos aqueles que têm relações especiais de emprego do Estado. A denúncia ao Ministério Público pode ser obrigatória ou facultativa, não reveste formalidades especiais, por força do artigo 246º, nº 1 CPP, salvo quanto às autoridades judiciárias e entidades policiais. Relativamente aos crimes públicos que tomarem conhecimento, neste caso essas entidades devem levantar auto de notícia, pelo artigo 243º CPP.
Este artigo 243º CPP dispõe que sempre que uma autoridade judiciária, órgãos de polícia criminal ou outra entidade policial presenciarem qualquer crime de denúncia obrigatória levantam o mandam levantar auto de notícia, onde se mencionem:
- os factos que constituem o crime;
- o dia, a hora, o local e as circunstâncias em que o crime foi cometido;
- tudo o que puder averiguar acerca da identificação dos agentes e dos ofendidos bem como os meios de prova conhecidos, nomeadamente as testemunhas que puderem interpor sobre os factos
O auto de notícia é assinado pela entidade que levantou ou mandou levantar o auto e remetido para o Ministério Público no mais curto espaço de tempo valendo como denúncia; o auto é um documento que vale como documento autêntico quando levantado ou mandado levantar por autoridade pública (artigo 363º, nº 2 CPP), seja autoridade judiciária ou autoridade policial (artigo 1º, al. b) e d) CPP) e por isso faz prova dos factos materiais constantes.
Quando o auto for levantado por outra entidade que não seja pública, tem o valor de simples documento particular, nunca provando a prática do crime.

Para facilitar a perseguição dos crimes, a lei impõe a certas entidades o dever de denunciar ao Ministério Público. É o que sucede com todas as entidades policiais relativamente a todos os crimes públicos de que houverem conhecimento. Igualmente para os funcionários, demais agentes do Estado e Gestores Públicos quanto a crimes de que tomem conhecimento no exercício das suas funções ou por causa delas.
A omissão de denúncia quando obrigatória constitui o crime de não promoção previsto e punível pelo artigo 414º CP. Pelo artigo 242º, nº 1; a denúncia é obrigatória para as entidades policiais relativamente a todos os crimes de que tenham conhecimento; para os funcionários públicos na acepção do artigo 386º CP; demais agentes do Estado e Gestores Públicos quanto aos crimes de que tomarem conhecimento no exercício das suas funções ou por causa delas. Assim sendo, deverão estas denunciar ao Ministério Público os crimes que tomarem conhecimento nestas situações.
No que respeita às entidades policiais, o dever de participar ao Ministério Público todos os crimes públicos de que tomarem conhecimento abrange não só os de que tomarem conhecimento directo, mas também, os de que tomarem conhecimento com informação de terceiro. Quanto aos restantes são obrigados apenas a identificar as partes.
Quanto à denúncia facultativa, qualquer pessoa pode denunciar ao Ministério Público os crimes públicos de que tiver notícia. Trata-se de uma faculdade e não de um dever.
A denúncia facultativa reveste 2 modalidades: a denúncia em sentido estrito e a queixa. A denúncia é sempre a transmissão ao Ministério Público do conhecimento de factos com eventual relevância criminal. Mas algumas vezes essa transmissão é um simples acto de ciência e, outras vezes exige-se que seja um acto de vontade. No primeiro caso quer significar que basta a transmissão da notícia do crime ao Ministério Público, para que este deva promover o procedimento criminal, seja qual for a vontade do negociante. No segundo caso basta que o Ministério Público adquira a notícia do crime para promover o processo. Exige-se que certas pessoas ou entidades manifestem ao Ministério Público a vontade de que seja promovido o procedimento, sendo isto o que sucede quando a lei faz depender o procedimento criminal de queixa e de acusação particular ou de participação de autoridade pública.
Relativamente a algumas categorias de crimes, o procedimento só pode iniciar-se desde que certas pessoas manifestem ao Ministério Público a vontade de iniciar o processo, isto é, se queixem. Estamos a falar de crimes semi-públicos e particulares. A queixa nada mais é que a transmissão ao Ministério Público da notícia do crime semi-público ou particular e da manifestação de vontade que o Ministério Público abra um processo.
A queixa distingue-se de denúncia na medida em que enquanto a denúncia é mera manifestação da ciência, isto é, transmissão ao Ministério Público do conhecimento da prática do crime; na queixa além da manifestação de ciência exige-se uma manifestação de vontade de que seja instaurado um processo para averiguação da notícia e procedimento contra o agente responsável.
Existe uma outra categoria de crimes cujo procedimento depende da participação de autoridade pública. Relativamente a estes crimes, também, só as autoridades indiciadas pela lei podem denunciar o crime ao Ministério Público como dos artigos 347º e 355º CP.

· Decisão do Ministério Público sobre o seguimento a dar à notícia do crime
O Ministério Público adquire a notícia do crime por conhecimento próprio, por intermédio dos órgãos de polícia criminal ou mediante denúncia, competindo-lhe apreciar o seguimento a dar-lhes – artigo 53º, nº 2, al. a).
O seguimento consiste na instauração ou não do procedimento. Face à notícia do crime, o Ministério Público pode considerar que não está em causa crime algum pelo que não lhe dará seguimento, mas tratando-se da notícia de um crime e verificados os pressupostos de legitimidade para que o Ministério Público possa promover o processo, então terá necessariamente de promovê-lo. Assim, perante a notícia de um crime, 2 atitudes podem ser tomadas pelo Ministério Público:
1. abrir o inquérito;
2. promover o julgamento quando estejam em causa processos especiais.
O inquérito inicia-se com um acto do Ministério Público a determinar a sua abertura. Este despacho do Ministério Público é um acto do procedimento e sem ele o processo é nulo, por falta de promoção do Ministério Público (artigo 119º, al. b)).

· Medidas cautelares e de polícia
Embora o processo se inicie com o acto do Ministério Público deve, também, dar-se alguma atenção a realidades anteriores ao processo, mas de grande importância, bem como a outros que já têm lugar durante o desenvolvimento do próprio processo. Tal é o que se passa com a notícia do crime que em rigor é um acto anterior ao processo e com os actos de polícia – artigos 248º a 253º. Actos que podem ser anteriores ou contemporâneos do processo.
o As medidas cautelares quanto aos meios de prova:
Os órgãos de polícia criminal devem praticar todos os actos cautelares e urgentes para assegurar os meios de prova mesmo antes de receberem ordem de autoridade judiciária competente para proceder à investigação (artigo 249º, nº 1), justificando-se tal pela urgência e pode ter lugar ainda antes de instaurado o procedimento ou já no seu decurso (artigo 249º, nº 3).
Enquanto os órgãos de polícia criminal actuam no decurso do procedimento por ordem da autoridade judiciária competente, praticam actos processuais. Quando actuam por sua iniciativa praticam actos da sua própria competência policial que depois serão ou não integrados no processo.
São actos que se justificam devido à urgência e só serão integrados no processo depois da sua aceitação ou confirmação pela autoridade judiciária competente.

o Identificação dos suspeitos:
O artigo 250º CP fala da actividade de identificação dos suspeitos e o pedido de informação a levar a cabo pelos órgãos de polícia criminal. É uma matéria onde se torna impossível separar funções de prevenção e de repressão e, por isso, pertence indistintamente à função administrativa e à função judiciária das polícias.
Também, em relação ao pedido de silêncio pode a pessoa perguntada ser suspeita de prática de um crime (não é assegurado o direito ao silêncio – artigo 590º).
As normas sobre identificação são muitas. O nº 1 do artigo 250º permite a identificação de quaisquer pessoas encontradas em lugares abertos ao público. O nº 2 refere-se à identificação dos suspeitos, isto é, só em casos de pessoas suspeitas incapazes de se identificarem ou no caso de se recusarem a fazê-lo podem ser conduzidas ao posto policial para identificação. Os órgãos de polícia devem fazer constar do auto o motivo do pedido de identificação e a razão de condição do indivíduo no posto policial para efeito do controlo da legalidade do uso de medida (artigo 250º, nº 4).
Quanto às revistas e buscas; os órgãos de polícia criminal podem proceder por sua própria iniciativa a revistas e buscas quando a urgência o exigir, sendo esta última que legitima estas diligências por parte destes órgãos.
As revistas e buscas são, em regra, autorizadas ou ordenadas pela autoridade judiciária competente (artigo 174º, nº 3), admitindo a lei excepções como a dos artigos 174º, nº 4; al. a), b) e c). No caso da alínea b) a razão é o consentimento do visado e; no caso das alíneas a) e c) o motivo é a prevenção de urgência. Uma outra excepção é a prevista no artigo 251º CP.
Estes actos de polícia criminal devem ser documentados para que possam ser fiscalizados pela autoridade judiciária competente a sua admissão no processo depende sempre da sua validação pelo juiz de instrução, por força do artigo 270º, nº 2.

o Apreensão de correspondência:
A regra é a de que só pode ser ordenada ou autorizada pelo juiz (artigos 269º, nº 1, al. b) e 179º). Daí que a apreensão pelos órgãos de polícia criminal só pode ter lugar com autorização do juiz (artigo 252º, nº 1). A excepção está disposta no artigo 252º, nº 3.
A correspondência apreendida é transmitida intacta ao juiz que tiver ordenado ou autorizado a apreensão, apenas se admitindo a abertura pelos órgãos de polícia criminal de encomendas ou valores fechados e sempre mediante a prévia autorização do juiz – artigo 252º, nº 2.

o Controlo das medidas de polícia:
De todas as medidas cautelares e de polícia levadas a cabo pelos órgãos de polícia criminal é obrigatória a elaboração de um relatório em que se descrevam as diligências efectuadas e os resultados obtidos, sendo estes remetidos ao Ministério Público ou ao juiz de instrução – artigo 253º.
Esta remessa do relatório ao Ministério Público tem a ver com a natureza da diligência, uma vez que estas medidas cautelares de polícia, em regra, ocorrem antes de se ter iniciado o procedimento, embora possam ocorrer, também, na sua pendência.

o Inquérito:
É utilizado pelo processo penal em 3 estados divididos, embora estritamente conexos.
Em estado cronológico, o inquérito é a fase do processo penal comum; em estado lógico é a actividade processual que ocorre no decurso da fase cronológica do inquérito e tem por finalidade essencial a decisão sobre a acusação e acessoriamente sobre o pedido de indemnização civil e aplicação das medidas de coação e garantia patrimonial. Enquanto actividade é um conjunto de diligências processuais que sob a direcção do Ministério Público tem lugar na fase cronológica do inquérito e visa investigar a existência de um crime, determinar os seus agentes e a sua responsabilidade e descobrir e recolher provas de ordem à decisão sobre a acusação, a aplicação de medidas de coação e garantia patrimonial e fundamentação o pedido de indemnização civil.

* Âmbito e finalidades do inquérito:
O artigo 262º, nº 1, quanto ao âmbito diz-nos que o inquérito é constituído por actos de investigação para esclarecer a notícia do crime e recolha de provas para prova dos factos apurados pela investigação. O inquérito tem por fim a decisão sobre a acusação.
Quanto à finalidade, findo o inquérito o Ministério Público há-de tomar uma entre 5 opções:
- arquivamento nas suas 3 modalidades
- suspensão provisória do processo
- acusação
Em qualquer dos casos a decisão do Ministério Público tem de ser fundamentada com a prova adquirida no inquérito e só nela o fundamento do Ministério Público.
O âmbito do inquérito respeita, deste modo, aos factos constitutivos do crime; às suas circunstâncias e ao agente.

* Competência para o inquérito:
O inquérito é da competência do Ministério Público, a quem cabe exclusivamente a sua direcção, mas apesar disso as diligências, que nele têm lugar podem ser realizadas pelo Ministério Público, juiz de instrução ou pelos órgãos de polícia criminal.
O CPP estipula certos actos do inquérito que só podem ser praticados ou autorizados pelo juiz de instrução e outros apenas pelo Ministério Público (artigos 267º e 268º), exceptuando-se certos casos expressamente reservados por lei como todas as diligências de investigação relativas ao inquérito podem ser delegados nos órgãos de polícia (artigo 270º).
O Ministério Público pode incumbir os órgãos de polícia criminal de praticar todos os actos de inquérito, isto é, o conjunto de diligências de investigação e recolhas de prova.
Os actos a que se refere o artigo 53º, nº 2; entende-se que não são delegáveis, constituem o cerne da acção penal que é atribuído ao Ministério Público.
Compete exclusivamente ao Ministério Público apreciar a notícia e ou não uma notícia de um crime; pois, por força do artigo 262º, nº 2; só a notícia de um crime dá lugar à abertura do inquérito, como lhe compete exclusivamente deduzir a acusação, sustentá-la e dirigir o inquérito. Interessa, ainda, referir os actos que são praticados pelo juiz de instrução.
Se estiverem em causa diligências da investigação ou recolha de provas apenas poderão ser praticadas ou autorizadas pelo juiz de instrução quando requeridos pelo Ministério Público ou pelos órgãos de polícia criminal, em caso de urgência ou quando requeridos pelo arguido ou assistente, e ainda se se tratar de actos necessários à salvaguarda dos seus direitos fundamentais.
Se são actos de competência do juiz a praticar no decurso do inquérito, mas não são actos de inquérito, poderão ser requeridos pelo Ministério Público, assistente ou arguido.
A direcção do inquérito pertence ao Ministério Público e só a ele compete decidir quais os actos que entende dever levar a cabo para realização das suas finalidades. Para a prática de alguns desses actos pode ser necessária a intervenção do juiz de instrução quer para consenti-los quer para praticá-los, mas só por sua promoção podem ter lugar, a não ser que estejam em causa direitos fundamentais (artigo 32º, nº 4 CRP).
Compete ao juiz de instrução, ainda que na fase de inquérito, a prática de actos de investigação que se prendam com os direitos fundamentais. Importa distinguir os actos de inquérito e os actos do juiz praticados; os actos do juiz praticados no decurso de inquérito não são actos de inquérito e por isso não estão sujeitos à promoção do Ministério Público.

Estrutura e duração do inquérito:
§ Estrutura geral do inquérito:
O inquérito enquanto fase processual inicia-se por um acto de iniciação e termina por um acto de encerramento, ambas da competência do Ministério Público. Entre o seu início e o seu termo praticam-se actos de desenvolvimento destinados à recolha de prova necessária, à fundamentação da decisão de encerramento.
O Ministério Público enquanto entidade competente para dirigir o inquérito é inteiramente livre de promover as diligências que entender necessárias ou inconvenientes à realização das suas finalidades (artigo 267º). Todavia, não deixa de haver certos actos obrigatórios no decurso do inquérito como no exemplo: o acto de encerramento tem de ser sempre notificado ao arguido, assistente, denunciante com a faculdade de se constituir o assistente e as partes cíveis (artigos 277º, nº 3; 283º, nº 3; 98º, nº 1; 61º e 69º).
A lei pode, ainda, relativamente a certos tipos de crimes, impor a prática de determinados actos no decurso do inquérito, sendo que a sua omissão, quando a lei não disponha expressamente sobre os seus efeitos, gera a nulidade por insuficiência do inquérito (artigo 120º, nº 2, al. d)).
A insuficiência do inquérito é uma nulidade genérica que só se verifica quando se tiver omitido a prática de actos que a lei prescreve; ou obrigatórios e desde que para essa omissão a lei não disponha de forma diferente a omissão de diligências de investigação não impostas por lei. Não determina a nulidade do inquérito por insuficiência, pois a apreciação da necessidade dos actos do inquérito é da competência exclusiva do Ministério Público.

§ Estrutura inquisitória do inquérito:
O inquérito é secreto, por força do artigo 86º, e unilateral. O inquérito é unilateral no sentido de que as diligências de investigação a praticar no seu decurso são tão só as que o Ministério Público considerar necessárias e convenientes (artigos 263º e 267º). Contudo, como órgão de administração da justiça que é, há-de buscar a verdade, e nesse sentido o inquérito é omnicompreensivo (actua nos 2 sentidos) e não unilateral, porque o Ministério Público deve actuar imparcialmente.

§ Prazos máximos de duração do inquérito:
A violação dos prazos do inquérito não acarreta outros feitos além das medidas de aceleração processual, que podem ser determinadas pelo Procurador-geral da República (artigo 109º CRP).
Os prazos máximos de duração do inquérito não são peremptórios. O que bem se entende dado não ser possível demarcar o tempo de duração de uma investigação. As diligências de investigação que decorram para além do prazo de duração máxima do inquérito, enquanto o mesmo não for encerrado, são válidas.
O prazo máximo que a lei estabelece é de 8 meses se não houver arguidos presos ou sobre obrigação de permanência na habitação; e de 6 meses se os houver (artigo 276º, nº 1 CPP).
Tratando-se de inquérito que tenha por objecto algum dos crimes previstos no artigo 209º; e estando o arguido preso ou sob prisão domiciliária, o prazo de duração máxima do inquérito é elevado para 12 meses nos casos referendos no artigo 215º, nº 3, isto é, quando inquérito tiver por objecto um dos crime previstos no artigo 209º e se se revelar de excepcional complexidade; no caso do artigo 276º, nº 2 quando existam arguidos ou ofendidos ou quando esteja em causa um carácter altamente organizado de crime; nos casos do artigo 209º devem conjugar-se os prazos de ração máxima do inquérito com os prazos de duração máxima da prisão preventiva.
O prazo conta-se a partir do momento que o processo corra contra a pessoa determinada ou em que se tenha verificado a constituição de arguido (artigo 276º, nº 3 CPP).
A aceleração processual pode ser requerida pelo Ministério Público, pelo arguido, pelo assistente ou pelas partes civis. Todavia, raramente é requerida, porque sendo o Ministério Público, o dominus do inquérito, poderá tomar as medidas que entende necessárias para apressar o seu andamento e não tendo o arguido ou o assistente acesso aos autos para poderem apreciar o estado da investigação e perceberem das razões do excesso de prazo.

ü Segredo de Justiça na fase de inquérito:
São muito poucos os actos de inquérito a que o arguido e o seu defensor têm direito de assistir e, por isso, também o direito do arguido intervir no inquérito oferecendo provas ou requerendo as diligências que julgue necessárias (artigo 61º, nº 1, al. f) têm escasso alcance prático em razão do desconhecimento do estado da investigação e dos elementos de indicação recolhidos.
O segredo do inquérito vale, também, relativamente ao assistente e, por isso, também a sua intervenção activa no processo e condicionada em termos semelhantes aos do arguido.
A questão do segredo da fase de investigação pré-acusatória (fase de inquérito) tem sido de, pelo menos à dois séculos, objecto das mais árduas discussões.
O segredo na fase de investigação pré-acusatória é, geralmente justificada por duas razões: eficácia da investigação e defesa da honoralidade do suspeito arguido.

A este propósito coloca-se o conhecido problema do equilíbrio entre a eficácia da investigação e a defesa do arguido.
Quanto à defesa da honoralidade do suspeito arguido, a questão assume actualmente novos contornos, a razão da expansão dos meios de comunicação social da liberdade e informação e do chamado jornalismo de investigação. É necessário distinguir a actividade de investigação pré-acusatória da actividade objectivamente jurisdicional na fase do inquérito. Naquela havia de manter-se o segredo da investigação para garantir a sua eficácia e limitando a sua duração; bastando criar meios para cumprir a lei, impondo a todos o segredo, incluindo aos meios de comunicação social.
Relativamente aos actos objectivamente jurisdicionais, importa que sejam públicos e que o arguido tenha efectivamente meios para se defender, o que passa pelo conhecimento das provas contra eles carregadas e que na perspectiva da acusação justificam a aplicação ao arguido, de medidas de coacção.
A publicidade dos actos jurisdicionais é uma forma de defesa do arguido no processo e na comunicação social.

ü Encerramento do inquérito:
§ Decisão do Ministério Público:
Concluídas as diligências de investigação e recolha de prova sobre a notícia do crime, o Ministério Público há-de tomar uma entre 5 opções:
. arquivamento (numa das suas 3 modalidades);
. suspensão provisória do processo;
. acusação.
Independentemente da decisão tomada nesta fase processual, a mesma terá de ser fundamentada com aprova recolhida no inquérito e apenas com ela. Só a prova recolhida través de actos de inquérito pode fundamentar aquela decisão. A decisão de arquivar, suspender ou acusar é do Ministério Público, embora seja um acto complexo, conjunto do Ministério Público e do juiz de instrução, em algumas modalidades de arquivamento.

§ Notificação ao arguido e ao assistente do resultado do inquérito:
O despacho de arquivamento do inquérito, nos termos do artigo 277º CPP, e a acusação pelo Ministério Público, nos termos do artigo 283º CPP, devem ser notificados ao arguido e ao assistente pelos artigos 277º, nº 3 e 283º, nº 5 CPP.
A notificação ao arguido do despacho de arquivamento, constitui em caso de falta, uma mera irregularidade; já no que respeita ao assistente ou ao denunciante com faculdade de se constituir assistente, constitui uma nulidade pelo artigo 120º, nº 2, al. b) e d) CPP.
A omissão da notificação do Ministério Público constitui sempre uma nulidade quer a omissão respeite ao arguido, quer respeite ao assistente. Constitui igualmente nulidade, a falta de notificação da acusação pública ou particular ao arguido. Do mesmo modo, constitui nulidade a omissão da notificação ao assistente do encerramento do inquérito nos crimes cujo procedimento dependa de acusação particular, para que possa deduzir a acusação.
Isto ocorre, em virtude, de estar em causa possíveis actos importantes para a descoberta da verdade.

§ Arquivamento e as suas modalidades:
Pode revestir 4 modalidades:
a. por inexistência de crime, pelo facto do arguido não o ter praticado ou por admissibilidade do procedimento (artigo 277º, nº 1 CPP);
b. por insuficiência de prova sobre a existência do crime ou de quem forem os seus agentes (artigo 277º, nº 2 CPP);
c. por opção do Ministério Público com concordância do juiz, encontrando-se expressamente previsto na lei a possibilidade de dispensa ou isenção de pena (artigo 280º CPP); e
d. pelo facto de o arguido ter cumprido injunções e regras de conduta que lhe tenham sido impostas na sequência da suspensão provisória do processo (artigo 281º e 282, nº 3 CPP).
No âmbito dos artigos 271º, nº 1 e 2; e 283º, nº 3 CPP; a decisão de arquivar o inquérito é da exclusiva competência do Ministério Público, embora possa ser submetida ao controlo judicial através da abertura da instrução.

No arquivamento do artigo 280º CPP já existe a concordância do juiz de instrução; concordância que é exigida igualmente na situação do artigo 281º CPP.
O arquivamento é uma decisão de natureza processual, não implica por isso um juízo de mérito embora possa ser determinada por razões materiais.

§ Arquivamento no âmbito do artigo 280º CPP:
É determinado essencialmente por razões de ordem de economia processual. O artigo 280º CPP impõe que a lei penal admita a possibilidade de dispensa ou isenção de pena. Todavia deve entender-se que a possibilidade não é o mesmo que obrigatoriedade.
O crime há-de estar indicado e verificar-se numa possibilidade razoável do agente vir a ser julgado responsável pela sua prática. A decisão do artigo 280º CPP tem que assentar na indicação da prática do crime e da responsabilidade do arguido.
Se a prática do crime e a responsabilidade do arguido não estiverem suficientemente indiciados, a decisão do Ministério Público há-de ser tomada no âmbito do artigo 277º CPP e não do artigo 280º. Ou seja, só podemos recorrer ao artigo 280º quando se possa deduzir acusação nos termos do artigo 283º. No caso de o Ministério Público se decidir pelo arquivamento do artigo 280º é necessária a concordância do juiz de instrução. O arquivamento do artigo 280º não equivale à decisão de julgamento, na medida em que o arguido não pode defender-se da indiciação nem opor-se ao arquivamento, pelo que há-de considerar-se presumido inocente relativamente aos factos pelos quais correm o inquérito arquivado (artigo 280º, nº 3 CPP).
Relativamente à concordância do juiz poder-se-ia entender que a mesma pressupõe apenas a verificação dos pressupostos de que a lei faz depender a decisão do Ministério Público e não o juízo sobre a adequação ou oportunidade da decisão do Ministério Público; ou então, que o juiz terá de formular um juízo sobre o próprio mérito da decisão de arquivar o inquérito.
A concordância do juiz não traduz um acto de fiscalização da legalidade do procedimento do Ministério Público, mas sobre a legalidade e adequação do arquivamento.
No artigo 280, nº 2 CPP; a exigência de concordância do arguido é justificada por haver possibilidade de acusação, o que implica um juízo de culpa por parte do Ministério Público. Permite-se ao arguido que não aceitando o arquivamento ao abrigo do artigo 282º possa obter uma decisão de mérito.

§ Arquivamento no âmbito do artigo 277º CPP:
Aqui o arquivamento tem natureza diversa. Agora é determinado por inexistência dos pressupostos necessários para absolvição do arguido a julgamento.
Se no inquérito se conclui que a notícia investigada não tinha fundamento, porque não foi cometido crime; impõe-se o arquivamento. A suspeita era infundada não se devendo abrir o inquérito se antes se souber dessa falta de fundamento. Se se conclui que não foi o arguido no processo o responsável pelo crime; não há razão para submetê-lo a julgamento. Assim, não existindo crime ou não sendo o arguido do processo responsável pelo mesmo, faltam os pressupostos de acusação e submissão a julgamento.
Caso semelhante ocorre quando o procedimento é legalmente inadmissível. Significa isto que, pode ser legalmente inadmissível por várias razões, que podem ocorrer no decurso do inquérito; ou no início, mas só serem conhecidas após a abertura do inquérito; ou porque se extinguiu o procedimento ou mesmo porque falta uma condição de procedibilidade.
No 1º caso temos como exemplo a morte de um arguido, a amnistia, a prescrição do procedimento criminal, sobrevindas após a abertura do processo (artigos 118º, 127º e 128º CPP). Além destes, temos ainda a desistência de queixa (artigo 116º CP) ou a não dedução de acusação nos crimes particulares (artigo 50ºCPP). No 2º caso temos o conhecimento superveniente da inimputabilidade do arguido da prescrição, do procedimento, ou da falta de legitimidade do Ministério Público para promover o procedimento. Nestes casos, também, deve haver arquivamento.
Nas hipóteses supra referidas o arquivamento tem sempre por fundamento a falta de pressupostos da acusação. O âmbito do arquivamento do artigo 277º, nº 2 CPP tem por fundamento uma razão diversa das anteriores. Aqui, o fundamento liga-se à insuficiência de indícios obre a prática do crime ou de quem foram os seus agentes.

O arquivamento nos termos do nº 1 do artigo 277º pressupõe a prova de não ter sido cometido crime ou dos agentes não serem responsáveis a qualquer título. A acusação só deve ocorrer quando forem recolhidos indícios suficientes de que houve crime e de quem o praticou, ou seja, do seu agente (artigo 283º).
Pode acontecer que não seja possível formular um juízo positivo ou negativo; não sendo possível formular um juízo positivo impunha-se formalmente um juízo negativo, sendo esse que traduz a decisão de arquivamento por insuficiência de prova. Não sendo razoável que face aos elementos de prova recolhidos no inquérito o arguido possa vir a ser condenado, ou não chegando sequer a constituir-se arguido, impõe-se a suspensão do procedimento até que sejam recolhidos indícios bastantes.
Se não é conhecido o agente do crime, não pode ocorrer a acusação; bem como no caso de não haver prova suficiente da existência do crime ou de responsabilidade do arguido, a acusação não seria sustentável em julgamento, sendo que esta fase, por um lado, seria um desperdício processual, e por outro, uma violência para o arguido.
O arquivamento no artigo 277º é sempre uma decisão da exclusiva competência do Ministério Público, podendo ser judicialmente fiscalizada através da instrução requerida pelo assistente com o fundamento de que deveria ser deduzida a acusação.
Pode, também, a decisão do arquivamento ser fiscalizada hierarquicamente por força do artigo 278º CPP.

§ Arquivamento no âmbito do artigo 281º e 282º CPP:
Outra modalidade de arquivamento é a que resulta do cumprimento de injunções ou regras de conduta impostas ao arguido de acordo com o previsto no artigo 281º CPP.
Cumpridas estas injunções e regras de conduta, o Ministério Público arquiva o processo não podendo ser reaberto (artigo 282º, nº 3); daí estas funcionarem como causa de extinção do procedimento.

§ Suspensão provisória do processo:
Aqui, não obstante a verificação dos pressupostos jurídico-criminais da acusação, pode o Ministério Público decidir-se pela suspensão do processo mediante a imposição ao arguido de injunções ou regras de conduta; e após essa suspensão por um período de tempo não superior a 2 anos e verificado o cumprimento das ditas injunções ou regras de condutas impostas, vai determinar-se o arquivamento do processo.
Buscam-se aqui soluções consensuais para protecção de bens jurídicos penalmente tutelados bem como a ressocialização dos delinquentes quando seja diminuto o seu grau de culpa e, em concreto seja possível atingir por meios menos gravosos do que a pena criminal, os fins que presidiam à incriminação em abstracto dos factos.
A suspensão provisória do processo só é aplicada quando o crime seja punível com uma pena de prisão não superior a 5 anos, ou com sanção diferente da prisão. Também, só ao arguido que não tenha antecedentes criminais, não lhe tenham sido aplicadas medidas de segurança, de internamento, seja diminuto o seu grau de culpa e seja de prever que o cumprimento de injunções ou de regras de conduta responda de forma suficiente às exigências de prevenção que no caso se façam sentir; exigindo-se assim um consenso alargado. Aqui, é necessária a concordância do arguido, do assistente e do juiz de instrução.
Estamos, aqui perante uma expressão do princípio da oportunidade, uma vez que a lei admite uma certa margem de discricionariedade do Ministério Público, embora estejam sujeitos a apertados pressupostos materiais e formais, justificada por razões de economia processual ou mesmo pela finalidade da pena criminal. Mas apesar de estas medidas não terem natureza de penas criminais, nada impede que a sua aplicação seja da competência conjunta do Ministério Público e do juiz de instrução; e que sejam aplicáveis em alternativa à submissão do arguido a julgamento.

§ Acusação:
O processo acusatório busca assegurar a imparcialidade do julgador. Atribui a órgãos distintos as funções de investigação e acusação por um lado; e por outro lado, o julgamento dessa acusação, assegurando-se a objectividade do julgamento, dos factos que são objecto da acusação.
Assim, a acusação é condição indispensável de sujeitar alguém a julgamento e onde se define e fixa o objecto do mesmo.
Quanto à acusação definir e fixar o objecto do julgamento, o nosso Código parece não consagrar uma resposta positiva. Pois o tribunal quer na fase de instrução quer na fase de julgamento, pode obstar ao conhecimento da acusação deduzida, se no decurso do processo lhe resultar fundada suspeita de que outros factos deveriam integrar a acusação. O tribunal deve ajuizar o fundamento da acusação pronunciando ou não o arguido, condenando ou absolvendo pelos factos acusados, mas apenas por esses. Mas, pode o tribunal devolver o processo para a fase de inquérito para que seja completada a investigação e eventualmente reformulada a acusação, no caso de o tribunal entender que a acusação está deficiente, pelo facto de outros factos se indiciarem que vêm alterar substancialmente o descrito. Assim, a reformulação da acusação justifica-se por um princípio de economia processual, nos termos do artigo 359º, nº 2.
Sendo certo que a acusação é indispensável ao julgamento, acaba por ter efeitos intraprocessuais e precários e a sua legalidade está sujeita à fiscalização pela jurisdição em vários momentos do procedimento, como o exemplo da decisão introdutória e outras, das formas e do juízo limiar que se consubstancia no artigo 311º CPP.

o Instrução:
No Código Processo Penal de 1987, a instrução vai assumir um duplo sentido. Por um lado, está em causa uma fase processual do processo preliminar e, por outro, uma actividade de comprovação da acusação visando decidir sobre a submissão ou não da causa a julgamento (artigo 286º, nº 1). Sendo a instrução, uma das fases do processo preliminar tem carácter jurisdicional e segue-se ao inquérito quando requerida com o fim de comprovar a acusação.
O artigo 286º, nº 3 CPP indica como finalidade da instrução, a comprovação judicial da decisão de deduzir acusação ou de arquivar o inquérito em ordem a submeter ou não, a causa a julgamento. A divergência é formal, pois a comprovação judicial da decisão de arquivar o inquérito só pode ser promovida através do assistente para abertura da fase de instrução, é que este requerimento consubstancia uma acusação que, nos mesmos termos da acusação formal condiciona e limita a actividade de investigação do juiz e a decisão instrutória.
No CPP, a fase de instrução foi estruturada com uma dupla finalidade: obter a comprovação judicial segundo pressupostos jurídico-factuais da acusação, por um lado; e por outro, o conjunto judicial da decisão agora processual do Ministério Público, acusar ou arquivar o inquérito (artigo 277º, nº 1 e 2 CPP).
O juiz decide na instrução se a causa deve ou não ser submetida a julgamento para que seja apreciado o mérito da causa. Quando não concorda com o Ministério Público não pronuncia o arguido; quando concorda pronuncia o arguido, respeitando assim formal e materialmente o princípio da acusação imposto pela estrutura acusatória do processo.
A instrução é uma fase processual quer em sentido lógico quer cronológico. Pois os actos de instrução são contíguos no tempo, tem lugar num determinado período temporal do processo, precisamente o que sucede ao encerramento do inquérito, e antecede a abertura da fase de julgamento. Também, nesta fase podem praticar-se actos que não são de instrução como por exemplo: decisão sobre medidas de coacção e garantia patrimonial, bem como tomar declarações para memória futura (artigo 194º e 294º).
A instrução é formada pelo conjunto de actos de instrução que o juiz entenda dever levar a cabo e obrigatoriamente por um debate instrutório (artigo 289º).
A fase processual de instrução é constituída por um complexo de actos de diversa natureza, visando eles a comprovação judicial da acusação. Está-se a falar de actos de investigação e recolha de provas do debate sobre o factos probatórios recolhidos durante a instrução e do inquérito, de formulação do debate sobre questões de direito de que depende o sentido da decisão instrutória, e da decisão sobre se a causa deve ou não ser submetida à fase de julgamento.
Todos estes actos são actos de instrução, embora nem todos são actos de instrução, podendo nesta fase, serem praticados actos que não lhe pertencem em termos lógicos, na medida em que não visam a realização da finalidade a que a instrução se propõe.

§ A instrução como fase jurisdicional facultativa do processo na forma comum:
Importa, desde já, dizer que os processos especiais previstos no CPP não têm instrução, em virtude da sua tramitação simplificada.
A instrução é uma fase jurisdicional do processo preliminar. A direcção da fase de instrução compete ao juiz (artigo 288º), e por isso poderia qualificar-se como jurisdicional. Porém ela qualifica-se como tal, não apenas pelo facto da sua direcção caber a um magistrado, mas sobretudo, porque nela se exerce uma actividade jurisdicional – apreciação pela jurisdição de uma situação factual concreta seguida de uma decisão proferida do ponto de vista exclusivamente jurídico.
A actividade processual desenvolvida na instrução é materialmente judicial e não policial ou de averiguações. O juiz pode levar a cabo autonomamente diligências de investigação e recolhas de provas (artigo 289º a 310º). Este artigo 289º é uma implicação do princípio da verdade material; no entanto, porque se trata de uma fase jurisdicional, a estrutura acusatória do processo e o inerente princípio da acusação vai limitar a liberdade da investigação ao próprio objecto da acusação.
A direcção da instrução compete ao juiz de instrução que pode conferir aos órgãos de polícia criminal o encargo de procederem a diligências e investigações, salvo tratando-se de actos que, por lei, lhe sejam cometidos de forma exclusiva (artigo 290º, nº 2).
Não pode, deste modo, conferir-lhe actos instrutórios, mas apenas as diligências de investigação e recolha de prova. Não podem ser concedidos aos órgãos de polícia criminal (OPC), os actos que se prendam directamente com os direitos fundamentais dos cidadãos por proibição da CRP. Não pode, também, o juiz de instrução confiar-lhes aqueles actos que a lei lhes reserve exclusivamente, independentemente da reserva constitucional.
A instrução é formada pelo conjunto de actos de instrução e obrigatoriamente pelo debate instrutório, mas a fase processual compreende ainda outros actos, nomeadamente a decisão instrutória.
A fase de instrução só terá lugar se for requerida pelo arguido ou pelo assistente, após verificados os pressupostos legais e apenas quando esteja em causa a forma de processo comum.

§ Legitimidade e fundamento para requerimento da instrução:

Requerida pelo arguido ou pelo assistente, a instrução é facultativa, na medida em que apenas existe, quando seja requerida por estes e verificados todos os pressupostos legais. Pelo arguido relativamente à acusação deduzida pelo Ministério Público ou assistente (artigo 283º); ou pelo assistente quando o procedimento depender de acusação particular (artigo 285º). O arguido pode, no prazo de 20 dias a contar da notificação da acusação, requerer a abertura da instrução fundamentando o requerimento com as razões de facto e de direito que, pela sua perspectiva deverão conduzir à rejeição total ou parcial da acusação (artigo 287º, nº 1, al. a) CPP).
Tal como o direito anterior, a instrução pode ser requerida pelo arguido com o fim de elidir ou enfraquecer a prova judiciária da acusação, mas também por razões puramente de direito material ou adjectivo, que a tornem admissível. Não parece que possa ter lugar a requerimento do arguido quando apenas pretenda elidir ou enfraquecer a prova ou preparar a defesa sem pretender a neutralização da acusação pela sua rejeição da decisão instrutória.
Isto revela-nos uma diferença fundamental da instrução no CPP de 1987 e da instrução contraditória da lei anterior. Ora, visava-se o controlo negativo da acusação; visando-se agora o complemento da instrução preparatória.
A alínea a) do artigo 287º dispõe que a instrução requerida pelo arguido é-o relativamente aos actos pelos quais o Ministério Público ou o assistente tiverem deduzido a acusação. Mesmo havendo acusação do assistente nos crimes públicos e semi-públicos, a instrução requerida pelo arguido há-de reportar-se primeiramente aos factos da acusação dominante, isto é, aos factos deduzidos pelo Ministério Público; e nos crimes particulares, mesmo quando haja acusação do Ministério Público, a instrução há-de reportar-se, também, à acusação deduzida pelo assistente.
Não se justificaria a abertura de uma fase processual quando o arguido apenas viesse elidir ou enfraquecer os indícios dos factos que não alterem substancialmente a acusação principal, uma vez que estes factos, independentemente de serem descritos na acusação ou na pronúncia, podem ser tomados em conta pelo tribunal na fase de julgamento (artigo 358º).
Também a instrução pode ser requerida pelo assistente e o procedimento não depender de acusação particular relativamente aos factos pelos quais o Ministério Público não tiver deduzido a acusação (artigo 287º, nº 1, al. b) CPP). O nº 2 do artigo 287º refere que o requerimento não está sujeito a formalidades especiais.

§ Debate instrutório:
Da instrução faz parte o debate instrutório, no qual podem participar o Ministério Público, o arguido, o defensor, o assistente e o seu advogado (artigo 289º CPP). O debate instrutório visa permitir uma discussão perante o juiz sobre se, do decurso do inquérito e da instrução, resultam indícios de facto e elementos de direito suficientes para a submissão do arguido a julgamento (artigo 298º CPP).
O debate não tem como componente a produção de prova, mas sim a discussão dos elementos de prova recolhidos na fase do inquérito e na instrução, e a produção de alegações de direito sobre a admissibilidade da acusação em ordem à submissão da causa a julgamento.
Quando considerado que não há lugar à prática de actos de instrução em casos que estes não tinham sido requeridos ou em 5 dias a partir da prática do último acto, o juiz designa dia, hora e local para o debate instrutório.
A designação da data, hora e local tem de ser notificado pelo Ministério Público ao arguido, assistente, pelo menos 5 dias antes dele ter lugar. Em caso de conexão de processos, a notificação para o debate instrutório é a feita aos arguidos que não tenham requerido a instrução (artigo 24º, nº 1, al. c), d) e e) CPP). Também, a data da instrução tem de ser notificada pelo menos 3 dias antes às testemunhas, peritos, consultores técnicos, cuja presença no debate o juiz considere indispensável.
A audiência do debate instrutório é semelhante à audiência de julgamento, baseando-se a distinção no facto de a audiência do debate instrutório não ser publicada ao contrário da audiência de julgamento.
O debate decorre se quaisquer formalidades especiais, oralmente e de forma contraditória, não só quanto à apreciação da prova indiciária recolhida anteriormente, mas também na própria produção da prova suplementar (artigo 301º, nº 2). É este contraditório que dá significado ao debate, como garantia de defesa.
O artigo 299º refere-se a actos supervenientes. O artigo 300º ao adiamento do debate. O artigo 301º refere-se à disciplina, direcção que compete ao juiz de instrução e ao debate. O decurso do debate é referido ao nível do artigo 302º.
É o juiz que vai abrir o debate com uma exposição sumária sobre os actos de instrução a que tiver procedido e sobre as questões de prova relevantes para a decisão instrutória. Seguidamente concede a palavra ao Ministério Público, depois ao advogado do assistente e ao defensor par que estes requeiram, se entenderem, a produção de provas indiciárias suplementares que se proponham apresentar durante o debate (artigo 302, nº 1 e 2).
As questões concretas controversas que admitem produção de prova suplementar são apenas as que forem enunciadas pelo juiz no início do debate (artigo 302º, nº 1), embora o debate não tenha de cingir-se apenas às questões que na opinião do juiz são controversas, mas pode incidir sobre a suficiência dos indícios recolhidos.
Em suma: depois de resolvidas estas questões, o Ministério Público, o advogado do assistente e o defensor podem requerer a produção de provas indiciárias suplementares.
O juiz pode ainda oficiosamente, no decurso do debate, ordenar a prática de novos actos de instrução que terão lugar no próprio debate ou determinarão a sua interrupção para que sejam produzidos tendo depois lugar a novo debate (artigo 299º e 304º, nº 2).
O nº 3 do artigo 302º diz que o próximo passo é a produção de prova feita sobre a orientação directa do juiz. O nº 4 refere que o juiz, antes de encerrar o debate, concede de novo a palavra ao Ministério Público, ao advogado do assistente e ao defensor do arguido.
O artigo 303º alude a situação de alteração de factos decorridos na acusação com requerimento para abertura da instrução.

§ Encerramento da instrução:
a) Prazos de duração máxima da instrução
Nos termos do artigo 306º, o juiz encerra a instrução no prazo máximo de 2 meses. Este prazo pode ser elevado para 3 meses se a instrução tiver por objecto os crimes previstos. Nos termos do artigo 306º, nº 3, este prazo começa a contar-se a partir do momento para a abertura da instrução. O artigo 307º refere-se à decisão instrutória que, resulta da análise do juiz de instrução após uma verificação cuidada de todos os elementos. Assim, a decisão a proferir pelo juiz após o encerramento da instrução, apreciando a acusação deduzida, denomina-se decisão instrutória, designando-se por pronúncia ou não pronúncia, consoante seja positivo ou negativo, isto é, conforme seja no sentido de submeter ou não a causa a julgamento (artigo 307º e 308º).
Se até ao encerramento da instrução tiverem sido recolhidos indícios suficientes de se terem verificado os pressupostos da punibilidade do arguido pelos factos da acusação, o juiz profere um despacho de pronúncia (artigo 308º, nº 1); caso contrário profere um despacho de não pronúncia.
Em suma: sempre que o tribunal conheça da acusação e se decida por recebê-la ou rejeitá-la, e neste caso sejam quais forem as razões da decisão, profere uma decisão instrutória de pronúncia ou não pronúncia.
O artigo 309º reporta-se às situações em que a decisão instrutória é nula, pois a decisão instrutória tem de ter por objecto a acusação e conter certos elementos necessários.

O despacho de pronúncia é a decisão instrutória que recebe a acusação e decide pela submissão da causa a julgamento. O artigo 308º, nº 1 CPP dispõe que, se até ao encerramento da instrução, tiverem sido recolhidos indícios suficientes de se terem verificado os pressupostos de que depende a aplicação ao arguido de uma pena ou de medida de segurança, o juiz, por despacho, pronuncia o arguido pelos factos respectivos.
Por força do disposto no artigo 309º, nº 1 CPP, a decisão instrutória é nula na parte em que pronuncie o arguido por factos que constituam alteração substancial dos factos descritos a acusação ou requerimento do assistente para abertura da instrução.
O despacho de não pronúncia é sempre uma decisão de não recebimento da acusação, quer se trate de acusação formal, quer de acusação implícita no requerimento instrutório do assistente. O despacho de não pronúncia é simplesmente uma decisão adjectiva, não uma decisão de mérito. O que verdadeiramente se busca na instrução é a comprovação da ocorrência dos pressupostos de submissão da causa a julgamento.
A instrução visa comprovar a legalidade da acusação. O despacho de não pronúncia declara que o processo não pode prosseguir, porque a acusação não está em conformidade com a lei ou já era inadmissível no momento da sua dedução ou até porque entretanto ocorreu qualquer facto que fez que no momento da sua apreciação já não corresponda às exigências legais.
Neste o juiz decide que os autos não estão em condições de prosseguir para a fase de julgamento por não se verificarem os pressupostos de que depende a aplicação ao arguido de uma pena ou medida de segurança criminais.

É possível recorrer da decisão instrutória?
Para responder a esta questão torna-se necessário atender ao artigo 310º CPP[SA7] .
É o único artigo que faz referência a recursos; podendo verificar-se 4 combinações possíveis da decisão do Ministério Público e da instrução.
A fase de inquérito pode acabar com uma acusação ou com um despacho de arquivamento. Em princípio, a acusação leva o facto a arquivamento ficando este por ali. No processo comum existe uma fase de instrução facultativa, uma vez que só existe a requerimento do arguido ou do assistente. A instrução, também, pode terminar através de um despacho de pronúncia ou através de um despacho de não pronúncia. O inquérito pode ser “controlado” através de um recurso hierárquico ou através da instrução.
Assim, importa fazer referência a 4 situações possíveis:
1º caso. O Ministério Público acusou e o arguido entende que a acusação é infundada, reunindo provas para contestar. A instrução, ao pronunciar, consubstancia a ideia do Ministério Público de levar o arguido a julgamento.
Verificam-se duas autoridades públicas que decidem no sentido de levar o arguido a julgamento.

2º caso. O Ministério Público resolve arquivar, e o assistente requer a abertura da instrução e o juiz de instrução não pronúncia.
Verificam-se duas autoridades públicas que decidem no mesmo sentido de não levar o arguido a julgamento

3º caso. O Ministério Público acusou, mas ao nível da decisão instrutória, o juiz de instrução profere um despacho de não pronúncia.

4º caso. O Ministério Público decidiu arquivar (despacho e arquivamento), mas o juiz de instrução entende pronunciar.

No 1º caso trata-se de uma decisão irrecorrível, nos termos do artigo 310º CPP. No entanto, não é sempre irrecorrível.
A acusação pode ser feita pelo Ministério Público (artigo 283º) no caso dos crimes públicos e semi-públicos e pelo assistente no caso dos crimes particulares.
Torna-se necessário fazer referência ao princípio da dupla conforma que, refere que a decisão instrutória só é irrecorrível quando duas autoridades públicas em momentos processuais diferentes decidem no mesmo sentido. As autoridades públicas, aqui em questão, são o Ministério Público e o juiz de instrução. Só quando se trata de crimes públicos e de crimes semi-públicos é que a decisão instrutória é irrecorrível de acordo com o princípio e nos termos do artigo 310º, pois elas decidem no mesmo sentido e só quando se passa à audiência de julgamento é que se vai decidir se o arguido é culpado ou não.
Levanta-se alguma polémica em redor do artigo 285º CPP, uma vez que não obstante existirem duas autoridades públicas a decidir no mesmo sentido, no caso do assistente, só a pronúncia é feita por uma autoridade pública.
Coloca-se assim a questão de saber o que acontece quando o Ministério Público junta a sua acusação ao assistente. Nos termos da acusação, a acusação principal é a do assistente. Não é irrecorrível, uma vez que não obstante existir uma acusação de uma autoridade pública, a acusação é feita pelo sujeito principal.

No 2º caso, no sentido de subtrair a causa a julgamento já é a decisão recorrível, de acordo com o artigo 310º.
Se tratássemos a possibilidade de recurso, estaríamos a retirar a possibilidade do princípio do juiz natural. O juiz natural é o juiz de julgamento, que não pode ter qualquer ligação com o caso, nem com as partes. Esta designação está de alguma forma errónea. Assim, o juiz natural é aquele que é competente para apreciar determinada causa que lhe seja atribuída. Haveria violação deste princípio, uma vez que se se considerasse esta decisão irrecorrível estaríamos a retirar a possibilidade desta ser apreciada em sede de julgamento.
O juiz de julgamento nunca se poderia pronunciar quanto a esta questão.
Nas outras 2 questões obviamente existe recurso, verificando-se 2 autoridades públicas que não se entendem quanto à solução para aquele caso.
O artigo 310º remete para o 399º. Este último é o princípio geral em matéria de recursos “é permitido recorrer de despachos…na lei”.
Nas outras 3 situações trata-se de um despacho de pronúncia ou não pronúncia, consoante o caso, que admitem recurso quando a irrecorribilidade não esteja prevista na lei. O único artigo que prevê a irrecorribilidade é o artigo 310º e só no 1º caso.
Em Processual Penal, ao contrário do Processual Civil, existe apenas um grau de recurso – al. a).

o Julgamento:
Quanto ao julgamento temos de ter em atenção o princípio do juiz natural, significando que o juiz do julgamento não pode ter qualquer ligação com o caso nem com as partes.

Como o processo penal chega ao juiz?
Pelo artigo 311º, o saneamento do processo faz-se por sorteio, que é feito, ainda, à segunda e à quinta-feira. O saneamento dá-se independentemente do processo chegar a julgamento, pois só através da acusação ou sobre pronúncia é que o processo é diferente.
Se tiver vindo de uma instrução (artigo 311º, nº 1); chega a julgamento através de uma pronúncia. Pronuncia-se sob as nulidades (questões de ordem formal como as assinaturas e questões prévias ou incidentais – amnistia, morte de uma das partes). As questões prévias ou incidentais são questões que o tribunal conhece e decide, susceptíveis de obstar à apreciação do mérito da causa; acerca das quais ainda não tenha havido decisão.
Se tiver vindo de uma acusação (artigo 311º, nº 2); despacha em outro sentido:
1. rejeita a acusação
2. de não aceitar
Falamos, aqui, em casos em que a acusação se considera manifestamente infundada (artigo 311º, n 3):
a) quando não contenha a identificação do arguido - se a acusação não contém a identificação do arguido ou não chega sequer a haver arguido, então o processo é inexistente; porque a partir da acusação não pode haver processo sem arguido, ou tratando-se de simples insuficiência suprível por outros elementos constantes do processo – mera nulidade sanável.
b) quando não contenha a narração dos factos – se não há factos objecto da acusação, não pode haver processo; sendo a relação inexistente, o processo não se pode manter e; por isso, o juiz não deve receber a acusação. A narração defeituosa, mas suprível, constitui nulidade sanável e, por isso, não é também causa de rejeição da acusação, senão for arguida.
c) senão indicar as disposições legais aplicáveis ou as provas que a fundamentam – a acusação que não contenha as disposições legais e indicação das provas é nula, por força do artigo 283º, nº 3, al. c), d), e) e f); mas tem de e tratar de nulidade dependente de arguição.
d) se os factos não constituírem crime – os factos narrados hão-de fundamentar a aplicação ao arguido de uma pena ou de uma medida de segurança, e só a pode fundamentar se constituírem crime. Se os factos não constituírem crime verifica-se a inexistência do objecto do processo, tornando-o inexistente e consequentemente não pode prosseguir.
Na instrução, estes factos já não são vistos, pois estes forma verificados aquando da instrução.
O artigo 312º tem como epígrafe data da audiência. Desde o momento que se recebe os autos não marca a data posteriormente a 2 meses (nº 1). O nº 2 diz-nos que são marcadas duas datas no mesmo despacho, ou seja, a primeira data para o julgamento efectivamente e outra data para o caso de adiamento. No nº 3 está em causa a garantia e a dignidade da pessoa relativamente aos seus bens. No caso de o arguido estar sujeito a medidas de coacção que o privam da liberdade, são, as datas da audiência, marcadas com prioridade.
O artigo 313º fala do despacho para a data do julgamento, que tem de conter, sob pena de nulidade:

Ø a indicação dos factos e disposições legais aplicáveis, o que pode ser feito por remissão para a acusação ou para a pronúncia, se a houver;
Ø a indicação do lugar, dia e hora da comparência;
Ø a nomeação de defensor do arguido, se ainda não estiver constituído no processo;
Ø a data e a assinatura do presidente.

O nº 2, 3 e 4 do mesmo artigo refere-se a questões processuais.
O despacho que designa dia para julgamento é notificado, acompanhado da cópia da acusação ou da pronúncia, ao Ministério Público, ao arguido e ao defensor, ao assistente; às partes civis e aos seus representantes. A notificação do arguido e do assistente é feita pelo contacto pessoal ou por via postal registada. Havendo notificação passam a ter conhecimento.
Pelo artigo 315º, o arguido tem 20 dias após a notificação para apresentar, querendo a contestação do rol de testemunhas (artigo 283º, nº 3, al. d)), sendo este interesse meramente formal; oferecendo o merecimento dos autos. Importa elucidar que a prova só se faz na audiência. O nº 3 do artigo 315º só se aplica quando estiverem em causa interesses especiais como a indicação dos peritos e consultores técnicos.
O artigo 316º refere-se à alteração ou adicionamento do rol de testemunhas. Deve-se indicar alguém para depois se alterar ou modificar testemunhas. Mas, se acontecer não as indicar, faz-se em abono do princípio da verdade material. No caso de se aceitar a indicação, faz-se um aditamento à acta.

Importa, agora, a análise da audiência. O artigo 321º, quanto à publicidade da audiência, diz-nos que esta é pública; salvo se o juiz entender que face à natureza da vítima ou à complexidade do caso, não deverá ser de todo público, confrontando o juiz as partes, informando-as. A publicidade pode ser, assim, restringida ou excluída.
O artigo 322º diz-nos a direcção dos trabalhos da audiência compete ao presidente e são tomadas sem quaisquer formalidades.
O artigo 323º diz que cabe ao juiz, e no caso de haver mais do que um, ao presidente os poderes de disciplina e direcção que constam nas alíneas deste artigo. Quando se refere o termo “legalmente admissível”, quer significar que a prova do inquérito não conta, só conta a prova produzida na audiência de julgamento. Também, se quer referir com “perguntas legalmente inadmissíveis”, às perguntas sugestivas e ardilosas. As perguntas sugestivas são aquelas que induzem a uma determinada resposta pretendida, isto é, indicia-se a resposta na pergunta que se faz. As perguntas ardilosas são aquelas que na pergunta incrimina-se a pessoa desde logo. A estas deve o juiz por termo, imediatamente que as detecte.
Em processo penal, as perguntas não são feitas directamente ao arguido, mas sim através do juiz. Mas pode o juiz dispensar, o que faz por regra.
O artigo 324º alude ao comportamento das pessoas que assistem à audiência. Assim, não devem estas pessoas, em caso algum, manifestar sentimentos ou opiniões.
Quanto ao arguido, de acordo com o artigo 325º, este tem de assistir à audiência livre na sua pessoa, não indo estar algemado; salvo se for estritamente necessário, sendo assim admissível. O detido ou preso deve ser o último a entrar na sala de audiência e o primeiro a sair dela. Impende sobre o arguido os outros deveres de conduta constantes neste artigo. Pelo nº 4 deste artigo, vale o possível advertimento só para aquela sessão.
O artigo 326º tem como epígrafe a conduta dos advogados e defensores. Os defensores são aqueles que assumem a defesa do arguido, e por sua vez, os advogados são os do assistente. Não podem estes fazer o que consta nas alíneas a), b), c) e d); podendo ser advertidos e até mesmo ser retirada a palavra, e no caso de este ser o defensor, pode confiar a defesa a outro advogado.
O artigo 327º fala do princípio do contraditório, ou seja, o contraditório na audiência. Assim, dispõe-se que os meios de prova apresentado no decurso da audiência são submetidos a este princípio, mesmo que tenham sido oficiosamente produzidos pelo tribunal e; que as questões incidentais sobrevindas no decurso da audiência são decididas pelo tribunal, ouvidos os sujeitos processuais que nelas forem interessados.
O artigo 328º alude à continuidade da audiência, sendo esta contínua; apesar de serem admissíveis interrupções estritamente necessárias. Em caso de interrupção ou adiamento da audiência por tempo superior a 8 dias, o tribunal decide quando a audiência é retomada, decidindo se alguns dos actos já realizados devem ser repetidos. O adiamento não pode exceder os 30 dias, sob pena de perda de eficácia da produção de prova já realizada (artigo 328º, 5 e 6).
A continuidade da audiência é uma das manifestações mais importantes do princípio da concentração. Este princípio define que o conjunto dos actos processuais que constituem a fase da audiência deve praticar-se tanto quanto possível concentrados no tempo.

Quanto aos actos introdutórios estão previstos nos artigos 329º e ss. Pelo artigo 329º, identifica-se o processo, passando-se ao chamamento das pessoas. Se falar algumas das pessoas, o funcionário faz nova chamada e depois, vai comunicar o rol dos presentes e dos faltosos. E, assim, declara-se aberta a audiência.
De acordo com o artigo 330º, no caso de falta do Ministério Público ou defensor dá-se a substituição pelo substituto legal (Ministério Público) ou por outro advogado ou advogado estagiário (defensor) e decorre a audiência. No caso de falta do representante do assistente ou partes civis inicia-se a audiência e quando ele chegar pode intervir. No caso de falta do representante do assistente dependente de acusação particular, a audiência é adiada por uma vez, podendo ser levada como desistência da acusação, salvo se o arguido se oponha.
O artigo 331º faz referência à falta do assistente, testemunhas, peritos, partes civis, que não dão lugar ao adiamento da audiência; podendo o juiz adia-la por uma vez com fundamento na falta destas por serem indispensáveis à boa decisão da causa.
O artigo 332º tem como epígrafe presença do arguido, sendo esta obrigatória; tendo de se verificar os outros números do artigo quanto a esta questão.
Na audiência de julgamento, a presença do arguido é, por regra, imprescindível, e neste caso promove-se a comparência, podendo levar a falta deste ao adiamento da audiência (artigo 333º, nº 1).
Ou, então, a audiência decorre sem a presença do arguido, podendo prestar declarações depois. Estes casos são excepcionais (artigo 333º, nº 2 e 334º, nº 1, 2 e 3). O artigo 332º, nº 2 e 3 dispõe sobre medidas que o tribunal pode tomar para assegurar a presença do arguido.
O artigo 334º refere-se ao julgamento na ausência do arguido, sendo-lhe aplicada termo de identidade e residência; medida esta que é inerente à constituição de arguido. Esta não tem de ser aplicada pelo juiz. E assim, garante-se ao tribunal a notificação do arguido.
O artigo 335º e ss articulam a contumácia, existindo esta na impossibilidade de notificar o arguido. Logo, a contumácia é a situação processual de suspensão dos termos do processo por ausência do arguido, que não tenha prestado termo de identidade e residência.
A declaração de contumácia é da competência do presidente do tribunal na sequência de notificação edital para que o arguido se apresente em juízo, sob pena de ser declarado contumaz (artigo 335º, nº 2).
O arguido declarado contumaz sofre efeitos imediatos como a anulabilidade dos negócios jurídicos de natureza patrimonial e, ainda lhe pode ser imposta a proibição de obter determinados documentos, certidões ou registos, bem como o arresto dos seus bens. Ainda implica a passagem imediata de mandado de detenção para efeitos de prestação de termo de identidade e residência e aplicação de outras medidas de coacção para coagir o arguido a comparecer em julgamento.
A declaração de contumácia é da competência do presidente do tribunal na sequência de notificação edital para que o arguido se apresente em juízo, sob pena de ser declarado contumaz (artigo 335º, nº 2).
A declaração de contumácia caduca, assim, que o arguido se apresente ou for detido.
O despacho que declarar a contumácia e aquele que declarar a sua cessação são publicados no Diário da República – artigo 337º, nº 6.
O artigo 338º enuncia as questões prévias e incidentais As questões prévias ou incidentais e nulidades são questões que o tribunal conhece e decide antes de se iniciar a produção de prova, susceptíveis de obstar à apreciação do mérito da causa; acerca das quais ainda não tenha havido decisão e possa desde logo apreciar. A discussão das nulidades e demais questões prévias ou incidentais deve conter-se nos limites do tempo estritamente necessários, não ultrapassando, em regra, uma hora.
Quanto às questões introdutórias, dispõe o artigo 339º, nº 1 que no início da audiência, antes de iniciada a produção da prova, o presidente faz uma exposição sucinta sobre o objecto do processo e dá a palavra ao Ministério Público, aos advogados do assistente, do lesado e do responsável civil e ao defensor para que cada um indique, se assim, o desejar, sumariamente e no prazo de dez minutos, os factos que se propõe provar.
As exposições introdutórias a que se refere o artigo 339º têm uma dupla finalidade: assegurar o contraditório “ab initio” da audiência, por um lado, e permitir ao tribunal acompanhar a estratégia e táctica da acusação e da defesa na produção da prova, por outro.

Quanto à análise da produção da prova, importam os artigos 340º e ss. O artigo 340º diz-nos que o tribunal ordena a produção de todos os meios de prova para a descoberta da verdade e para uma boa decisão da causa. No entanto, podem ser indeferidas a provas bem como os meios se estes forem legalmente inadmissíveis; pois violam o artigo 126º quanto aos métodos proibidos de prova. Ou seja, sempre que as provas sejam nulas por força do artigo 126º, não podem ser valoradas; senso assim, inadmissíveis nos termos do artigo 340º. Quanto aos meios de prova lícitos, obtidos por meios ilícitos adopta-se a teoria dos frutos da árvore envenenada, onde todos os frutos são envenenados. Isto é, não se aceita provas que se obteram licitamente, mas que o fundamento foi obtido ilicitamente. Como provas nulas temos as fotografias, as filmagens. As provas podem ser indeferidas pelos motivos das alíneas do artigo 340º, nº 3.
O artigo 341º articula a produção de prova; isto é, primeiro ouve-se o arguido, depois dá-se a apresentação da prova pelo Ministério Público e por fim apresentação dos meios de prova pelo responsável civil.
Quanto à identificação do arguido, temos o disposto no artigo 342º. O arguido é obrigado a responder ao juiz quando lhe for perguntado sobre a sua identificação, podendo incorrer em responsabilidade penal se se negar a responder ou se as declarações forem falsas. Quanto à exibição de documento, não tem de ser o bilhete de identidade, pode ser por exemplo a carta de condução; pois basta que seja um documento oficial bastante de identificação. Ora, é de notar que o arguido tem de falar relativamente às perguntas que versem sobre a sua identificação, podendo gozar do direito ao silêncio relativamente aos factos.
O artigo 343º verbaliza que o facto de o arguido gozar do direito ao silêncio, não o pode desfavorecer. Bem como se o juiz o vier a punir, não pode agravar a pena. Pode, também, o defensor fazer um sinal para o arguido não falar.
Quanto ao artigo 344º, importa dizer que no caso de confissão se renuncia à produção de prova, porque se assume a culpabilidade dos factos que lhe são imputados. Portanto, são dados os factos como provados. Passa-se de imediato às alegações orais, e depois à determinação da sanção aplicada com a respectiva redução da taxa de justiça para metade. O nº 3 deste artigo menciona o caso de existir co-arguidos; e não se verificando a confissão integral de todos eles, exceptua-se o disposto anteriormente. O nº 4 refere-se ao princípio da livre apreciação da prova – artigo 127º, comportando uma excepção: no caso de pena inferior a 5 anos, a confissão livre tem um limite, correspondendo-lhe os efeitos previstos no artigo 344º, nº 2 CPP. Importa dizer que estes requisitos não são cumulativos.
O artigo 345º faz referência às perguntas sobre os factos. O arguido tem de responder a todas as perguntas sobre os factos que lhe foram imputados e também prestar esclarecimentos sobre as suas declarações. Mas, também, pode recusar a resposta a alguma ou a todas as perguntas, sem que isso o desfavoreça.
O artigo 346º diz-nos que podem ser tomadas declarações ao assistente, pelas pessoas constantes neste artigo.
O artigo 347º refere-se às declarações do responsável civil e ao lesado, feita pelas entidades enunciadas.
O artigo 348º é bastante importante por dizer respeito à inquirição das testemunhas, estando estas sob juramento, ao contrário do arguido; podendo incorrer no crime de falsas declarações.
O artigo 349º refere-se a testemunhas menores de 16 anos, que só é levada a cabo pelo presidente; e querendo qualquer outro juiz, ou o Ministério Público, o defensor ou o advogado das partes civis ou do assistente formular perguntas, deverão ser estas pedidas ao presidente, para as formular à testemunha.
O artigo 350º refere-se às situações do estado do arguido, tendo de seguir o juiz a posição dos peritos e consultores técnicos, excepto quando ele próprio tem conhecimentos para tal.
Depois, é importante o artigo 360º, quanto às alegações orais. Concede o presidente a palavra ao Ministério Público, aos advogados do assistente e das partes civis a ao defensor para poderem expor as suas conclusões de facto e de direito. As alegações não podem exceder uma hora para cada um deles e as réplicas 20 minutos, não mandando obviamente o presidente calar nenhuma das entidades por exceder o mesmo.
O artigo 361º menciona que, findas as alegações, o arguido pode dar as suas últimas declarações, questionando o presidente sobre isso. Em seguida, este declara encerrada a discussão, sem prejuízo da reabertura da audiência para determinação da sanção; retirando-se o tribunal para deliberar.
Tudo isto se passa nos processos comuns, existindo, também, processos especiais.

· Tribunais:
Os tribunais onde as causas podem ser julgadas são os tribunais de júri, tribunais colectivos e tribunais singulares.
O nosso sistema não surge relacionado com o sistema anglo-saxónico. Mesmo a forma de apreciação é completamente diferente. Nos sistemas anglo-saxónicos, o juiz decide de facto, ao contrário do nosso sistema, em que o juiz decide de direito.
O artigo 13º, 14º e 16º referem-se a que tipo de tribunal a causa deve ser submetida.
Tribunal Singular
O artigo 16º alude ao tribunal singular quanto à sua competência. É um tribunal residual; existindo, aqui, um só juiz.
À partida é um tribunal competente para julgar tudo que não compete aos outros 2 tribunais. Compete, ainda, ao tribunal singular julgar os processos por crimes previstos no artigo 14º, nº 2, al. b). À partida estamos perante uma matéria que competiria ao tribunal colectivo.
Em princípio, nos termos do artigo 16º, o tribunal singular só é competente para julgar crimes, quando se trate de um concurso de infracções a que corresponda uma pena de prisão superior a 5 anos (em abstracto). Isto, quando o Ministério Público, na acusação e em concreto, entender que a pena de prisão não deva extravasar os 5 anos.
Neste caso, como em concreto, o juiz não vai aplicar uma pena superior a 5 anos; esse concurso de crimes pode ser julgado em tribunal singular.
Tribunal Colectivo
Relativamente às competências do tribunal colectivo, este encontra-se previsto no artigo 14º.
Sempre que ocorra a morte de uma pessoa é da competência do tribunal colectivo (artigo 14º, nº 2), e também cuja pena abstractamente aplicada seja superior a 5 anos de prisão.
Este tribunal é composto por três juízes, sendo o Presidente e os outros dois.
Tribunal de Júri
As competências do tribunal de júri encontram-se previstas no artigo 13º.
Para que a acção seja julgada num tribunal de júri, tem de ser requerido ou pelo assistente ou pelo Ministério Público ou pelo arguido. O facto de o crime ter uma moldura penal superior a 8 anos não significa que vá ser julgado no tribunal de júri.
Tem, ainda, de estar em causa crimes punidos com uma pena de prisão de 8 anos.
Torna-se necessário atender ao artigo 13º, nº 3. No caso do Ministério Público, este pode requerer, quando o julgamento seja no tribunal de júri. No caso do assistente, este pode requerer quando se esteja perante uma acusação particular. No caso do arguido, assim, que se verifique uma acusação, o arguido tem 20 dias para requerer a abertura da instrução e é nesse período que deve requerer.
O regime do júri encontra-se previsto no DL nº 387/A – 87 de 29 de Dezembro, onde se refere quais as condições para se ser júri.
O tribunal de júri é composto pelos três juízes do tribunal colectivo e por quatro jurados efectivos e quatro jurados suplentes.
A competência do tribunal de júri encontra-se prevista no DL, no artigo 2º, nº 3. O júri decide de facto, e, também, decide de direito; diferente do sistema anglo-saxónico.
O nº 3 fala da capacidade para ser jurado, podendo ser jurados os cidadãos inscritos no recenseamento eleitoral.

· Formas de processo especiais:
1. Processo sumário
O processo sumário é aplicável quando o arguido tenha sido apanhado em flagrante delito, por crime punível com pena de prisão cujo limite máximo não seja superior a 3 anos; desde que a detenção tenha sido efectuada por qualquer autoridade judiciária ou entidade policial, e a audiência se possa iniciar no máximo de 48 horas após a detenção (artigo 381º, nº 1) ou, em causa de adiamento da audiência, até ao limite do 30º dia posterior à detenção – artigo 386º, nº 1.
São, ainda, julgados em processo sumário, desde que a audiência tenha lugar nos prazos atrás referidos, os detidos em flagrante delito por crime punível com pena de prisão de limite máximo superior a 3 anos, mesmo em caso de concurso de infracções, quando o Ministério Público, na acusação, entender que não deve ser aplicada, em concreto, pena de prisão superior a 3 anos – artigo 381º, nº 2.
Para que o processo sumário seja aplicável, é necessário que o arguido tenha sido detido em flagrante delito por autoridade judiciária ou entidade policial, se a detenção tiver sido efectuada por qualquer pessoa do povo já não é aplicável o processo sumário – artigo 255º, nº 1, al. b).
A audiência, em processo sumário, há-de iniciar-se no máximo de 48 horas após a detenção, salvo se for adiada com algum dos fundamentos do artigo 386º.
Verificados os pressupostos do processo sumário, o Ministério Público não pode escolher a forma comum; o julgamento deve ser efectuado em processo sumário, salvo se a sanção puder ser aplicada em processo sumaríssimo.
O detido em flagrante delito, que deva ser julgado em processo sumário, é apresentado pela entidade policial que tiver procedido à detenção imediatamente ou no mais curto prazo possível ao Ministério Público, junto do tribunal competente para o julgamento.
A autoridade e tiver procedido à detenção notifica verbalmente, no mesmo acto, as testemunhas num número não superior a 5; e o ofendido. Aqui, o arguido é informado que pode apresentar até 5 testemunhas, notificadas verbalmente.
O arquivamento ou suspensão do processo faz-se nos termos dos artigos 280º, 281º e 282º.
O julgamento em processo sumário regula-se pelas disposições relativas ao julgamento em tribunal singular. Os actos são reduzidos ao mínimo indispensável à boa decisão da causa.
Se a audiência se não realizar em acto seguido à detenção, mas o processo puder ainda manter a forma sumária, efectuando-se a audiência dentro das 48 horas posteriores à detenção, o Ministério Público pode libertar o detido, sujeitando-o a termo de identidade e residência. Se a detenção ocorrer fora do horário de funcionamento normal da secretaria judicial, a entidade policial que tiver procedido à detenção, sujeita o arguido a termo de identidade e residência, liberta-o e notifica-o para comparecer perante o Ministério Público no 1º dia útil seguinte, à hora que lhe for designada, sob pena, de faltando, incorrer no crime de desobediência – artigo 387º, nº 2.
Se o Ministério Público verificar que não é possível a audiência imediata, nomeadamente porque a audiência não pode ter lugar nas 48 horas posteriores à detenção, liberta o arguido, sujeitando-o ao termo de identidade e residência, ou apresenta-o ao juiz de instrução para efeitos de aplicação de medida de coacção ou de garantia patrimonial – artigo 38º, nº 4 e 387º, nº 1.
As partes civis e os assistentes, com legitimidade, podem intervir desde que o solicitem, mesmo no início da audiência.
Quanto à tramitação, se o Ministério Público não estiver presente, o tribunal procede à sua substituição por um substituto legal. O Ministério Público pode substituir a apresentação da acusação pela leitura do auto de noticiada autoridade. Finda a produção de prova, a palavra é concedida, por uma só vez, ao Ministério Público, aos representantes do assistente e das partes civis e ao defensor. A sentença é logo proferida verbalmente – artigo 389º.
Sempre que se verificar a inadmissibilidade do processo sumário ou mesmo houver necessidade para a descoberta da verdade (a realizar-se no prazo máximo de 30 dias), o tribunal por despacho irrecorrível remete os autos para tramitação sob outra forma processual (artigo 390º).
Em processo sumário só é possível recurso da sentença ou de despacho que puser termo ao processo (artigo 391º).

2. Processo abreviado
Esta forma de processo está prevista nos artigos 391º-A e ss. Este processo tem lugar em crimes puníveis com pena de prisão não superior a 5 anos, havendo provas evidentes da prática do crime e tendo conhecimento do seu agente. O Ministério Público pode deduzir acusação, face ao auto de notícia, em processo abreviado se não tiverem decorrido 90 dias desde a data em que o crime foi cometido.
A acusação do Ministério Público deve conter os elementos do artigo 283º, nº 3. Se depender de acusação particular, a acusação do Ministério Público só tem lugar depois de deduzida nos termos do artigo 285º.
Pode o arguido, no prazo de 10 dias a contar da notificação da acusação, requerer o debate instrutório com a finalidade do artigo 298º. Aqui, o despacho do juiz é irrecorrível quanto ao saneamento do processo. Quanto ao julgamento observa-se o disposto no artigo 391º-E.

3. Processo sumaríssimo
É uma forma de processo especial prevista no CPP, os artigos 392º a 398º, sendo das principais inovações do CPP de 1987.
É agora pressuposto do processo sumaríssimo que, o crime seja punível com pena de prisão não superior a 3 anos ou com pena de multa. Verificado o pressuposto da gravidade da pena aplicável, quando o Ministério Público entender que é o caso deve ser concretamente aplicada pena ou medida de segurança não detentiva, requerendo ao tribunal que aplicação das sanções que propõe tenha lugar em processo sumaríssimo – artigo 392º, nº 1.
Se o procedimento depender de acusação particular, o requerimento do Ministério Público para aplicação das sanções em processo sumaríssimo depende da concordância do assistente.
Não é permitida a intervenção das partes civis, pelo disposto no artigo 393º.
O processo sumaríssimo inspira-se numa solução consensual e é inspirada, também, por razões de economia processual, à semelhança do que sucede com a suspensão provisória do processo. Por isso, para que seja aplicada a sanção nesta forma especial de processo, se exije a concordância do Ministério Público, do juiz, do arguido e do assistente, mas deste apenas quando se trate de crime particular.
O juiz só pode rejeitar o requerimento do Ministério Público para aplicação das sanções em processo sumaríssimo nas hipóteses previstas nas alíneas do artigo 395º, nº 1. Deste despacho não há recurso. Convém esclarecer a alínea c), onde o juiz rejeita o requerimento e reenvia o processo para a forma comum quando discordar da sanção proposta, sem prejuízo de poder fixar sanção diferente na sua espécie ou medida, desde que com a concordância do Ministério Público. Significa isto que, há-de ser perante os indícios constantes do processo que o juiz formulará o seu juízo sobre a adequação das sanções propostas pelo Ministério Público; e se delas discordar, pode, com o acordo do Ministério Público, fixar sanções diferentes. Se, entender que no caso devem ser aplicadas sanções detentivas, rejeita o requerimento e reenvia o processo para a forma comum.
Se não rejeitar o requerimento, nomeia defensor ao arguido e ordena a notificação do requerimento do Ministério Público; e, do despacho para que este, querendo, se possa opor no prazo de 15 dias. A notificação é feita por contacto pessoal e deve conter, obrigatoriamente, os elementos do nº 2 do artigo 396º. O requerimento é, também, notificado ao defensor. A oposição pode ser deduzida por simples declaração.
Quando o arguido não se opuser ao requerimento, o juiz procede à aplicação da sanção, acrescentando condenação de custas, sendo a taxa de justiça reduzida a um terço (artigo 397º, nº 1).
Se o arguido deduzir oposição, o juiz ordena o reenvio do processo para a forma comum, equivalendo à acusação o requerimento do Ministério Público.

o Princípios relativos às medidas de coação:

As medidas de coação só podem ser aplicadas a quem tenha sido constituído arguido, uma vez que estas contendem com os direitos das pessoas; só podendo ser aplicadas pelo juiz de instrução, à excepção do termo de identidade e residência – artigo 196º.
Quando estamos perante a fase de inquérito, as medidas de coação têm que ser requeridas pelo Ministério Público, e aplicadas pelo juiz de instrução.
Na fase de instrução, o juiz aplica-as oficiosamente como no caso de ser ele a designar esta fase.

1. Princípio da legalidade e tipicidade
Este princípio consta do artigo 191º, que nos diz que só podem ser aplicadas as medidas de coação previstas na lei. E quais são elas?
a. Termo de identidade e residência – não tem que ser aplicada pelo juiz de instrução, pode ser pelos OPC, excepcionalmente; ou pelo Ministério Público; visando evitar a contumácia – artigo 196º;
b. Caução – artigo 197º, só pode surgir se o crime imputado for punível com pena de prisão, podendo o juiz impor ao arguido a obrigação de prestar caução na fixação do montante da caução; tomando-se em conta os fins de natureza cautelar a que se destina a gravidade do crime imputado, o dano por este causado e a condição socio-económica do arguido.
c. Obrigação de apresentação periódica – artigo 198º, se o arguido for punido com pena de prisão de máximo superior a 6 meses, o juiz pode impor a obrigação de se apresentar a uma entidade judiciária em dias e horas preestabelecidas.
d. Suspensão do exercício de funções, de profissão e de direitos – artigo 199º, nº 1; se o crime imputado for punível com pena de prisão de máximo superior a 2 anos, o juiz pode impor ao arguido, cumulativamente com outra medida se for o caso, a suspensão do exercício de funções, de profissão e até de direitos.
e. Proibição de permanência de ausência e de contactos – artigo 200º, só se aplica em caso que haja fortes indícios de crimes dolosos puníveis com pena de prisão de máximo superior a 3 anos. O juiz pode impor, cumulativamente ao arguido estas proibições. Estas ocorrem, em regra, a seguir ao divórcio.
f. Prisão domiciliária ou obrigação de permanência na habitação – artigo 201º, se houver fortes indícios da prática de crimes dolosos punível com pena de prisão de máximo superior a 3 anos, o juiz pode impor a obrigação de se não ausentar ou de se não ausentar sem autorização da habitação.
g. Prisão preventiva – artigo 202º é uma medida excepcional. Aplica-se só quando as outras medidas de coação não se aplicarem ou forem insuficientes; podendo o juiz impô-la ao arguido quando se verificarem as alíneas a) e b) do mesmo artigo.

2. Princípio da necessidade da aplicação das medidas de coação
Só é possível aplicar uma medida de coação, quando esta seja inteiramente necessária. Há uma remissão do artigo 191º, nº 1 para o artigo 204º, que nos permite entender que as medidas de coação não são medidas antecipadas da pena, até porque o indivíduo presume-se inocente até transito em julgado da sentença de condenação.

3. Princípio da adequação
Este consta do artigo 193º. As medidas de coação devem ser adequadas às medidas de natureza cautelar que o caso venha a requerer.

4. Princípio da proporcionalidade
Também, consta no artigo 193º este princípio. As medidas de coação devem ser proporcionais à gravidade do crime e às sanções que possivelmente venham a ser aplicadas no caso concreto.

5. Princípio da subsidiariedade da prisão preventiva
Uma vez que a prisão preventiva é a medida de coação mais grave, só deverá ser aplicada quando todas as outras medidas de coação sejam insuficientes; isto é, a prisão preventiva entre nós é aplicada em última instância, tendo por isso um carácter subsidiário (artigo 193º, nº 2 que remete para o artigo 28º CRP).

6. Princípio da precariedade das medidas de coação

Segundo este princípio, as medidas de coação são revogadas se deixarem de subsistir as exigências de natureza cautelar, que levaram à sua aplicação. Se as exigências de natureza cautelar diminuírem, deverão ser alteradas pelo juiz, substituindo-a por outra medida de coação menos grave ou determinando uma forma menos gravosa da sua execução.
No caso de prisão preventiva, o juiz terá que a rever, oficiosamente, de 3 em 3 meses, os pressupostos que mantém a sua aplicação.

Todos estes princípios visam um princípio amplo, que é o princípio da presunção de inocência até ao trânsito em julgado de sentença de condenação.
Só cumpridos estes requisitos é possível aplicar as medidas de coação que seja comunitariamente suportável face à possibilidade do arguido ser inocente.
Pode haver recurso da decisão, de acordo com o artigo 219º, sendo o prazo máximo de 30 dias a partir do momento em que os autos forem recebidos.

Artigo 13º CRP: “1. Todos os cidadãos têm a mesma dignidade social e são iguais perante a lei.
2. Ninguém pode ser privilegiado, beneficiado, prejudicado, privado de qualquer direito ou isento de qualquer dever em razão de ascendência, sexo, raça, língua, território de origem, religião, convicções políticas ou ideológicas, instrução, situação económica ou condição social.”


Artigo 32º, nº 5 CRP: “5. O processo criminal tem estrutura acusatória, estando a audiência de julgamento e os actos instrutórios que a lei determinar subordinados ao princípio do contraditório.”


Artigo 206º CRP: “ As audiências dos tribunais são públicas, salvo quando o próprio tribunal decidir o contrário, em despacho fundamentado, para salvaguarda da dignidade das pessoas e da moral pública ou para garantir o seu normal funcionamento.”


Artigo 32º CRP: “. O processo criminal assegura todas as garantias de defesa, incluindo o recurso.


2. Todo o arguido se presume inocente até ao trânsito em julgado da sentença de condenação, devendo ser julgado no mais curto prazo compatível com as garantias de defesa.
3. O arguido tem direito a escolher defensor e a ser por ele assistido em todos os actos do processo, especificando a lei os casos e as fases em que a assistência por advogado é obrigatória.
4. Toda a instrução é da competência de um juiz, o qual pode, nos termos da lei, delegar noutras entidades a prática dos actos instrutórios que se não prendam directamente com os direitos fundamentais.
5. O processo criminal tem estrutura acusatória, estando a audiência de julgamento e os actos instrutórios que a lei determinar subordinados ao princípio o contraditório.
6. A lei define os casos em que, assegurados os direitos de defesa, pode ser dispensada a presença do arguido ou acusado em actos processuais, incluindo a audiência de julgamento.
7. O ofendido tem o direito de intervir no processo, nos termos da lei.
8. São nulas, todas as provas obtidas mediante tortura, coacção, ofensa a integridade física ou moral da pessoa, abusiva intromissão na vida privada, no domicílio, na correspondência ou nas telecomunicações.
9. Nenhuma causa pode ser subtraída ao triunal cuja competência esteja fixada em lei anterior.
10. Nos proessos de contra-ordenação, bm como em quaisquer processos sancionatórios, são assegurados ao arguido os dtos de audiência e defesa.


Artigo 211º, nº 1 CRP: “ Os tribunais judiciais são o tribunais comuns em matéria cível e criminal e exercem jurisdição em todas as áreas não atribuídas a outras ordens judiciais.”

Artigo 119º, nº 1, al. b) CRP: “1. São publicados no jornal oficial, Diário da República: as convenções internacionais e os respectivos avisos de ratificação, bom como os restantes avisos a elas respeitantes.”

a decisão instrutória que pronunciar o arguido elos factos constantes da acusação do Ministério Público…”